Os dias trinta do consulado Sócrates parecem ter o timbre das greves gerais. A memória pode falhar, mas as pichagens nas paredes das cidades, abundantes, refrescam-na. Ao andar pelas ruas, lá vem a lembrança do trinta de Maio da greve geral. Ao que se sucedeu o trinta de Novembro. De seis em seis meses, o primeiro-ministro tem que se incomodar com a conflitualidade social. Será cabalística sindical para irritar sua excelência?
Disse Pacheco Pereira, no Público de sábado, que se há mérito nas greves é o de serem um abanão no marasmo em que esta governação de maioria absoluta nos mergulhou. Já que a oposição “à direita” parece ter ido a banhos, ao menos há sindicatos para incomodar um governo que se afadiga em passar a imagem da infalibilidade, do determinismo, da impossibilidade de quem dele discorda vir a público sustentar a dissidência. E percebe-se Pacheco Pereira: descontente com o rumo aleatório do seu partido, convoca a greve geral como exemplo do pisa calos necessário para não cairmos – mais ainda – no adormecimento também geral que parece ser a estratégia deste governo.
Nisto das greves – e mais ainda quando o adversário dos sindicatos é este inepto governo – fico sem saber como reagir. Por definição, não alinho com os grevistas. Por um lado, há preconceito puro e duro, reconheço: a incapacidade de estar ao lado de comunistas para o que quer que seja. Por outro lado, as greves não são objectivamente justificáveis. São um privilégio dos funcionários públicos, já de si uma casta repleta de privilégios quando os não funcionários públicos entram em cotejo. Estar contra quem alimenta as greves não significa aliança com o governo – e menos ainda com este. Eis como me sinto dividido quando é agendada uma greve geral. Isto carece de uma explicação mais elaborada: não é bem uma divisão em dois hemisférios, como se uma metade se inclinasse para os sindicatos e outra para o governo. Em rigor, diante das greves sinto-me como num Benfica-Porto: gostaria que ambos perdessem.
As greves só não são lamentáveis porque contêm episódios hilariantes. Por exemplo, a prova de que somos um povo com larga incompetência para a matemática. Simples operações de aritmética, como contar os que não foram trabalhar e os que furaram a greve, motivam díspares contagens. De sexta-feira sobra mais um exemplo de como a matemática, ao contrário do que consta, está longe de ser uma ciência exacta. Entre os 80% de adesão dados a conhecer por sindicatos e os 20% oficializados pelo governo, um grave problema de matemática. E a prova de que ambos mentem. Se há impressão com que se fica na habitual “guerra de números” quando toca a apurar os efeitos da greve, é que muito se manipula nos dois lados.
Os piquetes de greve são outro alvo de escárnio. O espelho de como há palavras que ecoam falsas na boca de certos paladinos da “liberdade”. Os comunistas usam-na à exaustão. Na história das ideias políticas encerra-se o verdadeiro significado desta liberdade. Se dúvidas houvesse, sobretudo porque os tempos do império de Moscovo começam a pertencer às memórias que entram no tempo já remoto, os piquetes de greve são a febril manifestação de como a “liberdade” entoada por quem tem saudades da foice e do martelo é muito relativa. É a liberdade apenas dos que pensam como eles. Já não a liberdade dos que ousam divergir. A esses resta a liberdade dos que condicionam a sua liberdade. A liberdade dos indivíduos sucumbe perante a liberdade do colectivo. O problema é que explicar a liberdade do colectivo é tarefa árdua, só ultrapassada pelo espírito arbitrário dos pastores que foram emproados na condição de condutores do rebanho. Aí o que vale é a liberdade definida pelos pastores. Cada membro do rebanho sabe que a sua liberdade individual se recalca quando os imperativos do colectivo falam mais alto.
Se uma greve só é mediática se as percentagens de adesão ameaçam romper com o tecto dos 100%, os trabalhadores são instruídos a não furarem a greve. Para os renitentes, os piquetes de greve encarregam-se da necessária dissuasão. Se não for pela força da razão, após os argumentos dignos de um sacerdote que seja mestre na arte da retórica, sobra a razão da força. Primeiro, a força implícita, através da manipulação psicológica: o ostracismo dos que insistem em furar a greve, como se isso não constituísse um direito que lhes devia ser reconhecido. A greve é um direito, não uma obrigação. Uma singela confusão de conceitos em que os sindicalistas, decerto extasiados pela luta social, laboram. Se nem a coacção psicológica chegar, com um chorrilho de insultos à mistura, empregue-se a força física.
É disto que mais gosto quando no calendário aparecem greves. Ver imagens de piquetes de greve e de como a coacção da liberdade passa impune. E da impecável manipulação da matemática, também laudatória das partes desavindas numa greve geral. Aprende-se muito com as greves gerais.
Disse Pacheco Pereira, no Público de sábado, que se há mérito nas greves é o de serem um abanão no marasmo em que esta governação de maioria absoluta nos mergulhou. Já que a oposição “à direita” parece ter ido a banhos, ao menos há sindicatos para incomodar um governo que se afadiga em passar a imagem da infalibilidade, do determinismo, da impossibilidade de quem dele discorda vir a público sustentar a dissidência. E percebe-se Pacheco Pereira: descontente com o rumo aleatório do seu partido, convoca a greve geral como exemplo do pisa calos necessário para não cairmos – mais ainda – no adormecimento também geral que parece ser a estratégia deste governo.
Nisto das greves – e mais ainda quando o adversário dos sindicatos é este inepto governo – fico sem saber como reagir. Por definição, não alinho com os grevistas. Por um lado, há preconceito puro e duro, reconheço: a incapacidade de estar ao lado de comunistas para o que quer que seja. Por outro lado, as greves não são objectivamente justificáveis. São um privilégio dos funcionários públicos, já de si uma casta repleta de privilégios quando os não funcionários públicos entram em cotejo. Estar contra quem alimenta as greves não significa aliança com o governo – e menos ainda com este. Eis como me sinto dividido quando é agendada uma greve geral. Isto carece de uma explicação mais elaborada: não é bem uma divisão em dois hemisférios, como se uma metade se inclinasse para os sindicatos e outra para o governo. Em rigor, diante das greves sinto-me como num Benfica-Porto: gostaria que ambos perdessem.
As greves só não são lamentáveis porque contêm episódios hilariantes. Por exemplo, a prova de que somos um povo com larga incompetência para a matemática. Simples operações de aritmética, como contar os que não foram trabalhar e os que furaram a greve, motivam díspares contagens. De sexta-feira sobra mais um exemplo de como a matemática, ao contrário do que consta, está longe de ser uma ciência exacta. Entre os 80% de adesão dados a conhecer por sindicatos e os 20% oficializados pelo governo, um grave problema de matemática. E a prova de que ambos mentem. Se há impressão com que se fica na habitual “guerra de números” quando toca a apurar os efeitos da greve, é que muito se manipula nos dois lados.
Os piquetes de greve são outro alvo de escárnio. O espelho de como há palavras que ecoam falsas na boca de certos paladinos da “liberdade”. Os comunistas usam-na à exaustão. Na história das ideias políticas encerra-se o verdadeiro significado desta liberdade. Se dúvidas houvesse, sobretudo porque os tempos do império de Moscovo começam a pertencer às memórias que entram no tempo já remoto, os piquetes de greve são a febril manifestação de como a “liberdade” entoada por quem tem saudades da foice e do martelo é muito relativa. É a liberdade apenas dos que pensam como eles. Já não a liberdade dos que ousam divergir. A esses resta a liberdade dos que condicionam a sua liberdade. A liberdade dos indivíduos sucumbe perante a liberdade do colectivo. O problema é que explicar a liberdade do colectivo é tarefa árdua, só ultrapassada pelo espírito arbitrário dos pastores que foram emproados na condição de condutores do rebanho. Aí o que vale é a liberdade definida pelos pastores. Cada membro do rebanho sabe que a sua liberdade individual se recalca quando os imperativos do colectivo falam mais alto.
Se uma greve só é mediática se as percentagens de adesão ameaçam romper com o tecto dos 100%, os trabalhadores são instruídos a não furarem a greve. Para os renitentes, os piquetes de greve encarregam-se da necessária dissuasão. Se não for pela força da razão, após os argumentos dignos de um sacerdote que seja mestre na arte da retórica, sobra a razão da força. Primeiro, a força implícita, através da manipulação psicológica: o ostracismo dos que insistem em furar a greve, como se isso não constituísse um direito que lhes devia ser reconhecido. A greve é um direito, não uma obrigação. Uma singela confusão de conceitos em que os sindicalistas, decerto extasiados pela luta social, laboram. Se nem a coacção psicológica chegar, com um chorrilho de insultos à mistura, empregue-se a força física.
É disto que mais gosto quando no calendário aparecem greves. Ver imagens de piquetes de greve e de como a coacção da liberdade passa impune. E da impecável manipulação da matemática, também laudatória das partes desavindas numa greve geral. Aprende-se muito com as greves gerais.
1 comentário:
pois e os do visconde todos capados ! ihihihihihih
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