25.6.12

Um tempero a preceito


In http://e-geo.ineti.pt/divulgacao/dossiers/images/cartografia.jpg
Um esboço. É sempre de uma folha em branco que se parte. Às vezes, podem os primeiros traços que esboçam o desenho (um desenho qualquer) sair a custo da ponta do lápis. É quando o lápis se transforma em baioneta apontada contra quem o adestra. Os traços saem forçados, grosseiros, arrevessados nas suas rasuras – e as rasuras sobrepondo-se às ilusões que embaciam o olhar. Outras vezes, a mão que ampara o lápis parece domada pela inércia. É como se fosse impossível o desenho – ou como se, num acaso do tempo, a mão tivesse desaprendido a arte de desenhar para o mundo.
Mas há outras vezes, escassas ocasiões, em que o desenho, como as palavras ditas em sussurros adocicados, se desprende da mão. Tão espontâneo como o entreabrir dos olhos, ou o ar que se inspira e expira. Tão maquinal que se não dá conta da sua importância. Mas, todavia, tão essencial.
No mapa por diante, os dedos detêm-se, vagarosamente. Os olhos aproximam-se em demanda dos detalhes do mapa. São, os dedos, novos cartógrafos que mapeiam o terreno em redor. Eles redesenham o mapa. Com o atrevimento de rebatizar os lugares por onde passaram. E nem a penumbra obsta a função. Os montes e vales, as ribeiras que separam as porções de terra, exclamam pelas mãos que se entrecruzam. Os dedos numa harmonia intraduzível são pontes que abarcam toda a distância da paisagem. É nessa paisagem que as mãos são artífices de uma gastronomia transformada em quadro gigante. As cores, já não madraças, crepitam nos temperos aspergidos pelas mãos artífices. O tempo, o tempo que por tanto tempo foi apenas vindouro, tratou de levantar as pontas do véu. E tudo ficou ungido com a claridade de uma tarde banhada por uma nortada balsâmica. 
O segredo resguarda-se na alquimia dos temperos.

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