1.6.12

Os cães farejam


In http://0.tqn.com/d/vetmedicine/1/G/7/X/dog-nose-kalimistuk-sm.jpg
Continua o sobressalto dos espiões que esquadrinham, indecentemente, vícios privados de notáveis. É a chamada “baixa espionagem”. Quando era novo, aprendi que os serviços secretos só cuidavam de assuntos sensíveis para a soberania. Mas como a soberania cuida de se reconfigurar, talvez a modernidade tenha trazido uma nova missão aos serviços secretos. As ameaças coalham na devassa da intimidade de uns quantos notáveis. Os que mandam nos espiões devem andar entretidos com reality shows da televisão.
A cada dia, mais relatórios rasando a pente zero a intimidade de outro notável. Andamos inquietos. Meio na paródia, olhamos para os lados e para cima para perceber se não somos os próximos a cair na malha dos segredos cujo taipal foi levantado por zelosos espiões. Mas sosseguem: não somos notáveis. A nossa vidinha não interessa a nenhuma alma penada. Os espiões, recurso escasso (suponho, atendendo aos cortes a eito no funcionalismo público), estão focados na intimidade dos conhecidos. Os serviços secretos descambaram para uma versão hard core de revistas cor-de-rosa.
De resto, ao descapitalizarmos os serviços secretos cometemos uma terrível injustiça. Os espiões, cegos como devem ser, não olham a meios para chegar ao desiderato pretendido. São imparciais. Suplantam a impudicícia que cobre as manchas da vida privada que somos incapazes de revelar. Ora se tanto se apregoa a transparência, quem pode acusar os serviços secretos se eles são um poderoso branqueador? Poderão contrapor, talvez metidos na apoplexia de verem o vosso nome enxertado no sorteio do próximo relatório secreto: mas isso faz-se contra a vontade, e por cima do desconhecimento, dos visados. É feio. E pidesco.
Os tempos não varreram todos os despojos das vergonhas de outrora. Convençamo-nos. Esta cultura voyeur não deixa de nos morder nas canelas. É um sifão que deita uma espuma de bisbilhotice sobre a idiossincrasia. Os serviços secretos, que ainda existem pese embora o seu anacronismo, são um dos últimos, e bem guardados, redutos dessa aleivosia. 

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