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Enquanto houver amanhãs e os amanhãs
reclamarem de nós uma sede torrencial, os anos só pesam quando nos deixarmos
arquear pela tirania dos humores sequestrados. Mas somos teimosos: tiramos a
poeira dos antanhos e espevitamos o lustro dos dias claros filtrados pelas
nossas mãos. Pautamos a melodia da alegria.
Aqui ao lado, alma gémea. Curadora
dos sentimentos enobrecedores, feitora dos dias soalheiros mesmo que à frente
dos olhos poisarem nuvens pesadas que anunciam tempestades. Mas somos o sol que
perfuma o horizonte escondido detrás das nuvens medonhas. Bebemos na sua
grandeza os rudimentos da diferença que em nós habita. Desossados, toda a nudez
que deixa à mostra o que só uns olhos adestrados conseguem medir.
Vasculhamos em nós uma pureza que se
decanta nas palavras que deixamos a adoçar na boca. Olhamos por dentro dos
olhos. Os calafrios cauterizam a pele, sem deixarmos de perceber que os
porvires se desenlaçam das promessas que se tornam feitos. Feitos que nunca
foram travados outrora. E se as mãos se entrelaçam rompendo o sono, se as
palavras se acomodam à dimensão do que somos e as pétalas esvoaçam sobre as
nossas cabeças, é porque sabemos ser mentores do tempo ainda ausente.
Deixará de ser à medida que fomos convertendo o tempo ausente numa medida certa
de que somos alquimistas.
Aqui ao lado, enquanto se arvoram
palavras modestas em tirocínio de afeições, fermentam os imensos campos de
flores em que medramos. E nós, as mãos com as sementes que espalham as viçosas
flores pelo espaço que domamos, contemplamos as artes que nos dispõem mestres
florais. Bebemos as pétalas húmidas, inebriados com a coreografia de odores
campestres. Os imensos campos de flores que são só nossos.
É nesses campos de flores que nos deitamos para
resgatar as folhas perdidas do calendário que converterá o tempo ausente em
sonhos que o deixam de ser.
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