25.1.13

Ruço, o estouvado incorrigível


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Os amigos tinham uma barrigada de riso à custa do Ruço. O rapaz, desassisado como ninguém, fartava-se de asnear. Não o fazia de propósito. Era genético, como se os progenitores tivessem, por má arte, metido uns genes imprudentes no ADN do pequeno. Os amigos, estarolas e sempre à espera de desastres que desatassem o riso desbragado, nas folgas dos disparates traziam à colação façanhas anteriores que, mesmo à distância das recordações, faziam chorar de tanta gargalhada junta. E o pequeno e desajeitado Ruço ficava ali, impávido e enrubescido, em pose de testemunha involuntária das suas proezas pouco recomendáveis que eram razão de sobra para os estroinas se aliviarem das angústias pós-adolescentes.
Lembravam-se do Ruço a bater com as fuças no chão enlameado, naquele dia que foram andar de bicicleta para a pista de motocrosse. Ou de como ele ficou com as calças todas molhadas, na zona que desce dos genitais para os joelhos, e não fora razão outra que fosse terem-se libertado as águas, quando por fim uma moçoila se prontificou a livrá-lo do estado virginal em que repousava desde a nascença – e como a efeméride ficaria adiada para segundas núpcias, que não foram do conhecimento dos amigos que patrocinaram a ocasião falhada. Ou de outra vez, quando teimaram em dissolver a letargia das longas férias com partidas variadas (uns exemplos: tocar às campainhas e fugir a sete pés, molhar homens engravatados com cerveja em lata previamente agitada para toda a espuma se soltar na hora certa, pintar os para-brisas de carros pimpões com batom feminino fartamente rubro, colocar cubos de gelo debaixo do avantajado rabo de senhoras gordas no exato instante que antecedia o assentamento no banco do autocarro, ou travar o carro como quem promete boleia a quem a pedia na noite avançada e logo avançar uns metros quando o transeunte quase metia a mão na porta do carro).
Numa dessas partidas, estavam os da vida airada a distribuir chapadas pelos passageiros do comboio de longa distância que abalava do cais, quando notaram nuns ciganos que iam em sua direção para tirar desforço. O pobre Ruço, distraído como sempre, ficou aos pulos a ensaiar a próxima bofetada. Empolgado, nem deu conta da chegada dos ciganos que o puxaram pelos colarinhos e assentaram um arraial de porrada que deu direito a visita ao hospital.
Um dia, embebedaram o Ruço. Assim como assim, se o rapaz em sua sobriedade era um desastre pegado, haveria de ser bonito vê-lo com meia dúzia de canecos a turvarem os sentidos. Enganaram-se. O Ruço portou-se com fleuma digna de um lorde inglês. Não acusou, a quem o via de fora, um grama de álcool no sangue. Os amigos ficaram atónitos. E o Ruço aprendeu que, quando viesse o futuro e ele não quisesse ficar mal no retrato, trataria de beber uns copos. Já não era o Ruço desastrado que fizera as delícias dos amigos com outra linhagem estouvada.
O que ele não contava, era ter de frequentar os alcoólicos anónimos. 

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