21.1.13

Granada descavilhada

In http://www.africastarnews.net/newseditor/Upload/Images/hand-grenade-in-rwanda.jpg
Atirado para o meio da guerrilha, como carne para canhão como é insígnia dos guerreiros em todas as guerras, o guerrilheiro achou-se com uma granada na mão. No meio do fogo cruzado, alguém atirou uma granada que aterrou a meio metro dos seus pés. Estava descavilhada. Teve sangue frio para se deitar em cima dela. E destreza para tapar o orifício descavilhado com o dedo polegar. Com toda a força que tinha.
De repente, todo ele era um caudal de suores frios. Instantes que pareciam uma eternidade. E ele lavado em suores, nem parecendo que o inverno mordia os corpos com a sua severidade. A ninguém foi dado a perceber o dilema que o trespassava. Sabia que se tirasse o dedo polegar do orifício descavilhado não tinha mais mundo para olhar. Transformara-se na cavilha da granada. Mas o frio, em contraste com os suores que empapavam o fardamento, começava a adormecer o dedo polegar. Pelo tirocínio militar que tivera, sabia que trocar de dedo era hipótese impossível. Um vestígio de ar pelo orifício aberto detonava a granada. Seria o fim.
Contrariou a química já sua adversária. Empurrou com toda a força o polegar contra a abertura da granada. Tornava-a hermética, o mais que podia. Abeirou-se dele um companheiro de armas, e depois mais outro e um terceiro. Perceberam o risco. Num assomo de heroísmo, berrou-lhes para se afastarem. Fechou os olhos e percorreu em modo mental algumas imagens que se avivaram numa rápida retrospetiva. Era como se fizesse a si mesmo a extrema-unção.
Um laivo de esperança tomou conta dele, exortando aos deuses que a granada tivesse defeito de fabrico. Começou a ensaiar os passos meticulosos para o ardil da sua salvação. Teria de ser preciso na manobra. Levantaria o braço e teria de atirar a granada para longe, com toda a força que ainda tivesse. Não pensou duas vezes, que as forças se goravam. Lançou a granada. A seguir veio um sobressaltado desadormecer. Era um pesadelo. Nem era guerrilheiro em guerra nenhuma, nem havia guerra nenhuma, nem o seu fado estava aprisionado à embocadura de uma granada perdida.
Herdou, à conta de pesadelo com cores tão avivadas, uma cefaleia para o resto do dia.

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