13.3.13

Terra de ninguém


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Era o meio de nada. Onde não se avistava vivalma. Os sons, mesmo no seu silêncio, eram uma ruidosa cortina que entrava pelos ouvidos e desenhavam paisagens sonoras que se demoravam. Neste meio do nada, uns coiotes ao longe, onde o céu se escondia atrás das montanhas que não se distinguiam da aridez toda. Naquele meio de nada, onde fora em refúgio pessoal, como se do meio do nada soubesse encontrar as arestas frondosas que eram baias do tempo ainda ausente.
Era longe. Longe de tudo. Andara – assim se convencera – uma distância que não conseguia precisar. Muita distância. Não se lembrava como ali chegara. Só importava que estava naquele meio do nada e era lá que julgara encontrar as janelas de que precisava. A peregrinação não ajuizava que o corpo se detivesse a não ser que fosse para se dessedentar. A paisagem inóspita era igual na imensidão que era o meio do nada. À noite, enquanto fazia um frio glacial, recolhia-se num sono que ia de uma assentada até à alvorada. Um luxo que não tinha no seu quarto resguardado do bulício da cidade. Ao acordar, parecia que as entranhas se tinham cosido a um homem novo. Não havia fragmentos de cansaço, nem dores no corpo, nem o pensamento estava embaciado como acontecia tantas vezes antes de ter partido para o meio do nada. 
A peregrinação chegara ao fim quando já não tinha nada a aprender com os céus abertos com que a terra de ninguém o indultara. As mãos metiam-se na terra e já não havia sobressalto interior. À noite, a constelação abundante de estrelas que povoava o céu escuro já não tinha a cintilação que o encantara nas primeiras noites. De partida do meio do nada, cumpriu o regresso ao lugar de sempre. Quando lá chegou, as casas estavam no mesmo sítio, as árvores eram as mesmas, os carros em sua correria desenfreada não tinham mudado, e até os rostos se cobriam de um entesouramento distante que afivelava a desconfiança. Só ele percebia que estava tudo diferente. Em ensimesmamento, tivera a lucidez maior de todas: ele era o centro de tudo. Aprendeu-o no meio do nada.
Aquele meio do nada, embebido na grandeza que o esmagara, ensinou que do ensimesmar não pode abrolhar uma narcísica forma de ser. Nem um egoísmo que se consuma em sua atrocidade. Aprendeu que a humildade por excesso é uma reverberação narcísica. No meio do nada, onde a solidão imperou como bálsamo de todos os males.

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