In http://endtimesrevelations.files.wordpress.com/2011/02/3d_chess_board.jpg
Já desconfiava da bonança. A bonança interior,
depois da peregrinação repentina que devolvera a pacificação interior, nem arriscava
debater. Receava que se esboroasse à primeira contrariedade, incapaz de amparar
os seus escombros. Mas essas andanças introspetivas aprendera a domá-las (ou
acreditava que o tirocínio fora bastante).
Não conseguia era ter mão no que lhe
era exterior. As circunstâncias que não controlava, as palavras e as intenções
dos outros, os acidentes de percurso que eram teimosos recifes na claridade das
águas. Numa manhã, o escritório recebeu-o com informação que, admitira, não era
inesperada: tinha desemprego agendado para dentro de sessenta dias. Não desanimou.
Continuou a trabalhar com o empenho de sempre (pouco, concedia). Nos dias
seguintes chegou assíduo como dantes e cumpriu as tarefas como era habitual (com
zelo bastante, sem o entusiasmo dos colegas mais novos obrigados a repetidas
genuflexões aos superiores hierárquicos). Tinha a noção da carantonha que a
crise fazia a quem perdia o emprego. E sabia que na arte que era a sua estava complicado
encontrar outro sítio para trabalhar.
Não se declinou a boa disposição.
Todas as manhãs que amanheciam soalheiras eram posturas para o ritual que o
preenchia por dentro – a janela aberta para a luz clara se insinuar nos quatro
cantos do quarto. Não era a desocupação prevista para dali a pouco tempo, nem a
possibilidade de ficar sem réditos quando acabasse o subsídio de desemprego,
que tiravam o sono. Já nada tirava o sono, tamanha a plena paz interior. Tomado
por eito por este otimismo que era tanto que o assustava, convencera-se que o
desemprego não era sentença. Era oportunidade sob custódia de um desafio. Era
como se um sexto sentido sussurrasse nos interstícios do pensamento que dali
haveria de sair solução tão proveitosa que não podia esquecer de obsequiar pelo
natal quem o despediu.
Nos momentos lúdicos começou a pensar
como seria o tempo passado quando estivesse por tanto tempo desocupado. Esboçou
projetos, compulsou o que nunca houvera tempo para empreender. Era tão farta a
lista que, com a aproximação do dia do desemprego, até no horário de expediente
passou a tratar da ocupação dos tempos que seriam desocupados caso ele não
tivesse tratado de lhes arranjar destino.
O desemprego não era uma camada densa
de nuvens pesando sobre a cabeça.
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