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(Outro ensaio falhado de
literatura infantil)
A raposinha palmilhava os
trilhos por onde só as cabras montesas andam. Era dia de caça, que a fome
apertava. Umas bagas comestíveis que irrompiam de arbustos, um trago nas poças
que a chuva tinha alimentado durante o inverno que terminara. A raposinha tinha
de andar com cuidado, evitar as veredas que eram território dos lobos ferozes e
dos ursos grandalhões. Não convinha pôr as delgadas patinhas em terreno
desarborizado, que podia levar com as garras afiadas de uma águia esfaimada e
nunca mais via o sol nascer.
Era, ao mesmo tempo,
predadora, a raposinha. De pequenos roedores que fugiam dela como ela fugia dos
animais carnívoros maiores que ela. Quando a fome encolhia o estômago e os
roedores tinham mais destreza, descia os montes e achegava-se à aldeia. As
cenouras eram deliciosas, havia batatas a rodos, era só trepar às árvores e as
sumarentas laranjas saciavam-na com a sua doçura. A raposinha escavava as
terras lavradas, o que deixava os agricultores enfurecidos. Ela sabia que os
lavradores estavam à coca, com sacholas e caçadeiras prontas para despachar
violência no seu dorso, caso a vissem a prevaricar. Eles não sabiam que ela
sabia que eles estavam em vigilância.
A raposinha contorcia-se de
riso quando via, ao longe, os lavradores a praguejarem ao notarem que o terreno
tinha sido remexido e a lavoura tinha de ser feita outra vez. Era marota, a
raposinha, salpicava-se-lhe o goto de prazer quando observava os agricultores
de rabo para o ar a remediar os estragos que fizera. É que a raposinha lera uns
livros. E não gostou de saber que os agrários eram mantidos pela abastança das
subvenções públicas que retiravam a todos para prolongar a agonia de uns
poucos. A raposinha aprendera que a injustiça não merece consideração. Ela reinventou
uma moral reprimida entre os homens: com o mal se retribui outro mal. Tinha de
se lhe desculpar. Pois apesar de letrada e bem intencionada, a raposinha
pertence à casta dos animais irracionais.
Já os lavradores, mal
sonhavam que lidavam com uma raposinha adversária tão letrada.
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