In http://data.whicdn.com/images/15455797/lose_control_by_eliseenchanted-d4bdn4w_large.jpg
Nessa noite o sono
demorou a encontrar o seu lugar. Era por causa do Aníbal, que tinha morrido em idade vivaz. Algumas vezes se
lembrara do Aníbal, o que apenas acontecia
das vezes que o acaso (como disse antes, em frequência excessiva) os punha no
mesmo sítio ao mesmo tempo. Como a
conversa era sempre sobre as desgraças e azares que compunham o
dia a dia do Aníbal, acabava por perder a
meada do sono a pensar nas intempéries que o visitavam com tanta
assiduidade.
Se havia comportamento
que desprezava nos outros era o moralismo, como se os outros vivessem dentro de
uma nuvem insuspeita, cobrindo-se de arrogância para ensinar lições de como ser e atuar. Depois, porque as vidas tinham um
curso próprio, como os rios têm o seu caudal a romper entre rochas e vales sem que alguém se oponha ao trajeto. Mas quando esbarrava no Aníbal e tinha de escutar estórias de destemperança, não conseguia reprimir o
pensamento sobre os alinhavos de tanto descontrolo. Tentava perceber que precipícios tão sedutores atraíam o Aníbal.
Há quem prefira sucumbir nos sobressaltos que enchem uma
vida. Há quem se desengane nos campos
triviais, onde as flores apanhadas são sempre iguais e não mudam de perfume. Há quem se incentive com as
penumbras escondidas em alvoradas nascentes, porque são essas, de tanta incerteza, que auguram subsídios de um dia diferente dos que são calibrados pela semelhança cansativa. Há quem se deixe arrebatar pelas paixões neófitas que escondem a espessura das gentes. Há quem puxe os punhos em guarda se uma rixa assoma num lugar
qualquer. Vivem em sobressalto, fogem em sobressalto. Dormem onde calhar, às vezes exilados em paradeiro incerto porque há gente pouco recomendável que os procura para
retaliação sangrenta. Há quem faça tirocínio permanente a como perder o controlo. A pior cadeia a
que podiam condenar estes estroinas era o comodato da placidez.
E tal como um rio
segue pelo seu caudal, deitou-se sobre o travesseiro a interrogar se o exílio na marinha mercante não era uma apressada fuga por
temor de aprender a perder o controlo. Diria: os rios são domesticados por barragens. Elas tutelam os rios ferozes
que querem sair do caudal. Adormeceu sem saber resposta a uma pergunta: o
navio, sua itinerante emigração, era uma barragem que
acalmou a sedução pela perda de controlo?
Sem comentários:
Enviar um comentário