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É a desordem na autoestrada: um
camião de transporte de suínos despistou-se e os recos, ato contínuo, soltam-se
da prisão e vêm espalhar a confusão no alcatrão. Os bácoros desaustinados,
errantes como se diz acontecer com as tontas baratas, e os utentes da
autoestrada forçados ao estacionamento, ou uma coisa má lhes acontece se acertarem
num pesado porco desorientado.
Os suínos, histriónicos e
acometidos pelo pânico, irrompem furiosamente pelo alcatrão. Dir-se-ia estarem
tomados por uma alucinogénica substância, tão heróis avançam pela autoestrada
sem saberem se vão no sentido do obrigatório sentido ou em contramão. Furiosos,
arremetem com o focinho ensanguentado, não pelo trambolhão que poderia ter
esfacelado corpos na fricção violenta contra o solo, mas porque adivinhavam o
matadouro que queriam evitar, barrando o nariz contra as grades untuosas do
camião de transporte. As reses andavam por ali, umas rebolando-se no alcatrão
em sinal de demência, outras resguardando-se na relva desmanchada do separador
central da autoestrada. Um ou outro, ferido e esvaindo-se em dor, acometido
pela fúria indomável, mete o focinho contra carros estacionados, amolgando-os. Os
donos contagiam-se com o desatino da vara. Começa a guerra: pessoas desmioladas
a tentarem placar porcos como se fossem jogadores de rugby, os porcos como
adversários, fazendo as vezes de jogadores de rugby, ensaiando fintas mal ajeitadas que o sobrepeso prejudica a
destreza.
No meio da confusão, um porco
enraivecido mete o dente na perna de uma senhora inocente que tinha posto o
pezinho fora do carro para saber o porquê de tanto banzé. Um camonista, ainda a
dissolver as duas garrafas de tinto tragadas ao almoço (ele assegura que conduz
melhor com uma pinga de vinho), sonha com o presunto generoso de um bácoro à
mão de semear.
Entretanto chegou a polícia
armada com bastões e redes para aprisionar porcos relutantes. Alguns utentes,
preventivamente resguardados dentro dos carros, entoando as preces necessárias
para os cascos imundos das reses não provocarem danos na carroçaria, ficam
perplexos ao saberem que a polícia estava equipada com redes de captura de
animais. Só que os porcos são de tamanho extra e o desnorte que deles se
apoderou torna-os criaturas temíveis. Os polícias agem timoratos (viram a
senhora a ser mordida, e como sangra da perna entumecida). Os mais corajosos
avançam com as redes. Um tropeça na rede arrastada por um porco de acasalamento,
os cascos do animal pisoteiam o polícia que fica deitado no alcatrão, mesmo ao
lado de um pedaço de estrume entretanto defecado.
E o polícia, entre a lucidez
e o desmaio, só consegue pensar como os porcos avulsos são catedráticos em
desonestidade intelectual.
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