In http://jovemurso.files.wordpress.com/2010/12/burning_xmas_tree.jpg
O vestido transparente ondeava
na penumbra. Os pés frágeis, desnudados, deslizavam com a suavidade da pele
transida pelo frio noturno. Mas o ritual imprecava suas demandas, e nem o frio
outonal desembaraçava a vontade de o acatar.
A lua intimidada fazia-se
testemunha. Ao longe ouvia-se o que parecia ser o uivar de lobos em desnorte. A
casa estava longe, o solo era a cama do orvalho que se deitara sobre as pedras
ungidas pelo musgo. Os pés continuavam, frágeis e amedrontados, fazendo o
caminho na servidão do desconhecido. A luz tímida da pequena lua não chegava
para ser devida candeia. O vestido largo e transparente, que deixava aos
olhares tresmalhados a silhueta esbelta, ruminava passos temerários. Espreitou
por entre as veredas o que pareceu ser uma fogueira. A luz que se incensava
tomava conta do pequeno céu emoldurado no firmamento a que o olhar chegava.
Passou a ser sua bússola, pois o temor do lugar desconhecido gritava por alguma
luz caridosa.
O clarão ficava mais perto
mercê dos pés nus que a atiravam para as proximidades do fogo que incandescia
em sua volúpia. Descobriu uma árvore tomada pelo fogo. Uma árvore isolada, as
demais sem mácula do fogo, testemunhas da desgraça daquela singular árvore. Nem
as faúlhas que fulguravam, furiosas, conseguiam atear fogo nas árvores
vizinhas. Seria da humidade da noite, as árvores restantes empenhadas no
resguardo do orvalho.
Ficou estática,
requentando-se no calor que se soltava da incandescência, mas apoquentada pela
fogueira em que se tornara a isolada árvore. Pareceu-lhe ver um vulto desenhado
nas labaredas que se despenteavam dos ramos em evanescência. O vulto ensaiava
movimentos com os braços, acenava para poente. Do poente não conseguia perceber
o que poderia ser almanaque. Fez a vontade ao vulto abraseado que viera das
profundezas do fogo. Pela madrugada, já nas suas costas a claridade depunha a
vetusta noite, chegou ao fim da andadura. Por diante, o mar.
O cansaço desenhado no rosto e a noite em branco, que
deixavam estragos de uma insónia, embaciaram alguma lucidez. Entendeu depois. O
nutriente que exclamava pela sua presença era o mar salgado por diante. Não se
intimidou com as águas frias. Atirou o corpo murmurado ao mar que julgara malsão.
Foi quando lá longe o fogo que deixara a árvore em meras cinzas se voltou para
dentro. E ela, molhada e tiritando de frio, foi recolhida por um pescador que a
deixou em casa. Completara a tarefa. E ela, enfim, reavivada.
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