19.8.13

As árvores morrem de pé


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No meio da floresta não são as árvores viçosas que se distinguem. Uma simples árvore em decadência salta à vista entre a paisagem uniforme. O busto carcomido, castanho mortiço, de uma árvore despida de vegetação sinaliza a morte. E, todavia, ela mantém-se de pé, resistente às intempéries que se põem sem aviso.
A madeira dura promete inércia por muitos anos, mesmo que a seiva já não corra nos interstícios da árvore. As árvores vizinhas amedrontam-se por a terem como exemplo do que serão quando a senescência já não aguentar os últimos laivos de existência. Olham-na como exemplo. Como uma matriarca que dita o respeito, mesmo tendo havido o despedimento da vida. Quem visita a paisagem detém-se na árvore solitária que determina a exceção. As mãos percorrem a rugosidade da sua pele, impressionam-se com a dureza da madeira que não entrou em apodrecimento. Perguntam, as mãos, quantos anos de vida teve a árvore. Sabem que dali não vem resposta, nem que em fantasiosa elucubração as mãos julgassem ouvir uma árvore vizinha, pujante no seu viço esverdeado, balbuciar número que rimasse com a idade vivida pela árvore decessa.
As mãos enviam ao córtex central o temor da decadência. Selam um ânimo que, porém, não se reproduz na espécie humana. Os homens não morrem de pé, como dá às árvores que expiram mas teimam, inteiras, a mostrar que perduram na memória de quem pertenceu à sua memória. Desnuda-se a semelhança entre as árvores de uma floresta e as pessoas que estão num grupo. Os mortais imortalizam-se nas memórias de quem as acha merecedoras. A comparação finda por aí. A decadência física e o sono mental não deixam que os mortais se imortalizem como se fossem estátuas. As árvores ficam a ganhar na comparação. Ou talvez não.
Que serventia teriam cadáveres transformados em estátuas? De resto, poucas são as árvores que perduram na sua finitude. As árvores morrem de pé, diz-se. Até que venha um madeireiro ceifá-las para matéria-prima. O povo, quando atesta que as árvores morrem de pé, só não sabe dizer que essa é uma raridade. 

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