Morphine, "French Fries", in http://www.youtube.com/watch?v=2n7yOkeFJMM
Alguma literatura consagra as
criancinhas. Destilando um ódio pelos crescidos, desencoraja os petizes a
querem ser, ou apenas a fazer de conta que são, adultos. Deixai as
complexidades para a idade adulta e aproveitai a meninice que desconhece as
torpezas que hão de acontecer pela batuta da madurez. Dizem: é na infância que
somos puros.
Desajeitados na sua maturidade mal
pendida, ou desenganados por sobressaltos que espigaram a dor, queriam, se
pudessem, voltar muito atrás no tempo. Imagino que se imaginam prisioneiros da
infância, no regozijo dessa condição que não consideram um cárcere. Mas a
biologia não cauciona fantasias. Os corpos crescem. As mentes também. E ascendem
das profundezas as sombras que enxotam a lucidez. Parece que não contam os
confortos que houve durante a alforria da meninez. Só contam os sobressaltos
que inflamaram a dor, as vilanias que açambarcam os tempos, a capitulação que
cresce com o tempo que se devia fazer madraço. É gente que vive depressa quando
queria passar devagar pela vida; ou gente que segue com vagar quando apetecia
estugar o passo pela existência. Desaproveitam os anos de ouro que são os da
lucidez desembaraçada das imberbes fantasias.
Tudo ao contrário: a tenra idade é uma
maçada. Um espartilho incómodo quando somos protegidos dentro de uma
incubadora, porque lá fora o mundo é terrível. É o pior dos engodos. Porque se
o mundo lá fora é terrível, as criancinhas deviam ser treinadas desde que são
gente. Mais tarde, as dores são lancinantes. Pois estão impreparados para
suportar a tempestade em que se metem, já sem o baraço de quem os protegeu no
seio de seu cais progenitor. A tenra idade é uma maçada. Desconhece os prazeres
que a madurez adestra. Que mal vem ao mundo quando tropeçamos em gente soez, ou
se somos gente soez (que a ninguém é dado o atributo de ostentar uma canhestra
e arrogante superioridade)? Os estarolas desenganados vagueiam na sua errância.
A maior de todas é quando bolçam as saudades do tempo em seu retrocesso, até
pararem na longínqua idade de que tudo se diz ser inocência.
A infância é desinteressante. Mais
desinteressantes são os cultores da estética da infância. Cálice erguido, pois,
aos prazeres que são antítese da infância.
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