In http://strawberryindigo.files.wordpress.com/2013/10/free-hugs.jpg%3Fw%3D835%26h%3D400%26crop%3D1
Noites bem dormidas. Isentas de
pesadelos. Um sono atapetado por lençóis de seda. Só possível aos que não
tropeçam em apoquentações. Aos que se abraçam ao mundo com os defeitos que são
seus, e os do mundo, sem decair num palco dramático, onde o negrume realista
berra tão alto.
As alvoradas são sempre erupções
radiosas, as cores abrindo-se numa cornucópia de flores pujantes em seu
perfume. “Os olhos sem olheiras vêm
melhor”, diz para os seus botões enquanto espreita no espelho da casa de
banho depois de discernir o tempo lá fora (por sinal, chuvoso). As baias do
dia, de todos os dias, são da sua autoria. Não vira a cara ao lado obscuro do
mundo, em abruptas doses servido pela imprensa. Mas não capitula. As desgraças,
as mortes, as misérias, as decantações da bondade (em sua furtiva debandada),
as aleivosias, os disfarces, a contumaz ilação superficial – o cardápio inteiro
que os olhos, ausentes de olheiras, desfolham enquanto se desembaraça do
pequeno-almoço.
“Plano
do dia: o mesmo dos dias anteriores: descer à rua, uma qualquer movimentada no coração
da cidade, e oferecer abraços às pessoas que passam” – regista mentalmente.
Pois não há, naquela casa, nem nas casas em redor, ninguém com quem trocar umas
palavras. Não é isso que o entristece. Está vacinado contra a melancolia.
Tivera a sua dose. Aprendera com a inutilidade da melancolia. E aprendera como
é escasso o tempo de sobra. Por mais que seja – é escasso. Não pode esse tempo
ser domado pela melancolia, ou pelas forças que usurpam a escuridão e embaciam
a humanidade.
Saiu à rua. Pôs uma fatiota a preceito,
apessoado como iria para o escritório (que já não era seu poiso). A tiracolo,
as tarjas de cartão por onde enfiaria a cabeça assim que subisse da estação do
metro a uma das ruas centrípetas da cidade. Na tarja, em letras de cores
garridas, o dizer ostentatório: “ofereço
abraços!” Assim como assim, tinha de transformar a desocupação numa
utilidade, tinha de fugir da hibernação. Para os outros, indiferentes ou não à
sua generosidade afetiva. E para o tempo seu que, desocupado, não podia ser
convertido em bálsamo de sobressaltos.
As lágrimas, não as enxugava de si
mesmo. Retirava-as dos rostos fechados dos anónimos que aceitavam um abraço. Nem
que fosse por uns segundos.
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