25.2.14

O navio fantasma

In http://blog.agenciapreview.com/blog/wp-content/uploads/2010/10/17OCT10_NavioFantasma.jpg
As águas lodosas eram o leito do navio que mais parecia uma silhueta. Parado, ao longe, embebido na ferrugem que o tingia com a cor de uma antiguidade. Pararam-no num canto, num lugar recôndito do cais, onde poucos se atrevem a ir. Dizem que se ouviam sussurros lúgubres sempre que alguém se aproximava.
Ninguém sabia quem era seu capitão quando fundeou. Apenas se sabe que foi durante a madrugada, estavam os sentinelas em descanso, e o navio aportou num estertor clandestino. Ninguém viu os marinheiros a desembarcar. Ninguém sabe que carga trazia. Visto ao longe, parecia uma penumbra que teimava em não perecer. O estranho caso do navio não deixava ninguém indiferente. Dele rezam histórias medonhas, de rituais que se cumpriam quando as nuvens escondiam o luar, ou quando a lua se escondia dos olhos humanos. Ninguém queria dizer o que sabe sobre a história do navio. Houve quem viesse de longe, atraído pelo estranho caso que é o navio. Os trabalhadores da estiva e os locais desconversavam quando um forasteiro pedia informações sobre o navio fantasma. Desconfiavam que estivesse embruxado. Logo a seguir ao enigmático fundear do navio, aconteceram três mortes macabras, algumas doenças súbitas, uns atos tresloucados de gente respeitável. Não podia ser coincidência. Só podia ser tramoia do navio contumaz.
O tempo foi correndo e ninguém via movimento no navio. Ninguém correu o risco de ir a bordo, nem as autoridades queriam romper o mistério instalado. O navio sequestrou-se dentro das suas muralhas. Deitou-se naquele recôndito canto do cais, onde as águas mais lodosas faziam confluência. Até o nevoeiro desaguava naquela parcela do cais, alimentando o fantasmagórico navio. E nem o mar corrosivo chegava para o importunar. A ferrugem que crescia era uma camada que se somava à penumbra que era o navio. Os mais corajosos que ao perto conseguiram chegar juraram que o navio não vacilava no seu perene flutuar. E juraram, expeditos, que de cada vez que ao de perto chegavam, uma súbita neblina tombava sobre o navio, cobrindo-o de mais penumbra.
Uma madrugada, sem que ninguém contasse, o cais que já se considerava leito perene do navio fantasma achou-se vazio. Zarpara sem pré-aviso. Os vigilantes juraram a pés juntos que ninguém entrara no cais. Sobrou o mito do navio fantasma. Diz-se que era um navio sem tripulação. Outros dizem que aquele navio nunca existiu.

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