17.2.14

Heróis num dia

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Jurávamos que os heróis não interessam. Jurávamos que não os havia, heróis. Os que o julgassem ser eram embustes, medrando numa fantasia loquaz. Viviam sitiados numa alucinação, achavam-se curadores de proezas que não estavam à mão de semear dos demais, dos que não podiam tocar na sublime dimensão da heroicidade. Julgávamos que os heróis eram néscios, pois os heroísmos quase sempre desaguam numa morte. E por mais temerária que essa morte fosse, por mais salvações que tivesse arregimentado, era sempre, e apenas, uma morte. Todas as mortes, ao serem uma perda, são inúteis. Os heróis também.
Mas naquele dia uma maresia diferente transtornou-os. As bissetrizes adulteravam os ponteiros da bússola. Acordaram com o olhar sem freios. As mãos suadas, apesar da alvorada, desconfiavam da insinceridade do tempo. Era como se aquele fosse o tempo despido das amarras do tempo e todo o tempo respirasse por entre os poros abertos. Ungiram-se com a magnitude dos eleitos, em contravenção com os ideais (não havia escolhidos). As mãos não se enxaguavam. Os olhos prometiam não capitular no cansaço. Às voltas com a maresia incessante, entronizaram-se heróis. Não importava o que os outros dissessem. Era como se tudo lá fora se tivesse reduzido às suas existências. Ou como se o mundo estivesse parado à espera das suas resoluções.
Não era um sonho. Não havia nuvens a contrariar o luzimento do céu que era o cais de onde emanavam os feixes que vinham repousar em seus ombros. Sabiam: que aquele era o dia em que eram heróis. Só naquele dia. Curavam as maleitas que eram o sofrimento do mundo. E nem assim os seus ombros arqueavam. Reis por um dia, ao menos nesse dia rejeitaram dogmas que eram todo um pretérito. Um longo dia depois, quando nem o sono reivindicava seu lugar, deitaram-se. Não sabiam se o dia depois era o fio condutor dos anteriores, ou se a véspera fora o início de uma aprendizagem.
Ser herói era a humildade da ignorância dos que não chamam a si oráculo nenhum. Eram, pois, heróis na sua antítese.

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