In https://www.youtube.com/watch?v=v535cv-n0sY
O maldito triângulo das Bermudas que nos
atira areia para os olhos: políticos, jornalistas (a soldo, ou sem perceberem
que estão nessa condição) e cidadãos eleitores. A intermediar a relação, a
ênfase na imagem. Tudo é imagem. Tudo se reconduz à imagem. Para que os
destinatários da comunicação se distraiam com o acessório e não tomem atenção
no essencial. Nada mais para além da imagem.
Vamos lá outra vez a uma tão bem montada
encenação. A ministra das finanças como atriz principal. Alguém se lembrou de
compor a imagem da senhora. Afinal, ela não é uma personagem ingrata, a
maquiavélica fautora de uma política de sacrifícios (a que muitos apelidam de
empobrecimento), uma cabra insensível às dificuldades que semeou no caminho de
tanta gente, um testa-de-ferro da Alemanha mandante. Lá no fundo, a senhora
ministra tem um bom fundo. Contratou-se uma agência de comunicação,
convidaram-se os jornalistas para a encenação, e nós, os cidadãos que decidimos
através do voto, também fomos convidados ao embevecimento. A ministra das
finanças foi de visita a um refúgio de crianças órfãs. Vimo-la no tocante gesto
de pegar ao colo em crianças que não têm pais, ou cujos pais são tão
sacripantas que elas foram entregues à proteção do refúgio. A ministra ri,
nota-se-lhe emoção. A ministra das finanças não tem um coração empedernido.
Escorria afeto ao falar com as crianças desvalidas. Supunha-se que ficássemos
comovidos.
Ninguém perguntou: o que fazia a
ministra das finanças na coutada de um colega seu (o refúgio de crianças órfãs
não é área tutelada pela pasta das finanças)? Era uma visita privada da
ministra das finanças, que ali despia a fatiota da sinecura e se despia como
cidadã interessada pelo bem-estar de crianças que já passaram pelas piores privações?
Se a visita era privada, que não cuidasse de aparecer nas televisões. Às vezes,
um ato piora o diagnóstico. A ministra pode ter coração, como se diz que todos
temos. Não era preciso mostrá-lo. Nestas condições, é um exibicionismo
descabido.
Um dia depois, uma notícia ajudou a
compreender a operação de relações públicas que pretendeu mostrar que a
ministra das finanças, afinal, não é uma cabra insensível: ela veio dizer que a
disciplina orçamental vai durar. Quem pensava em alívios, que se desengane. O
carinho da ministra das finanças é apenas para as crianças órfãs. Essas, que
ainda não votam.
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