Trentemoller, "The Dream" (feat. Low), in https://www.youtube.com/watch?v=luLMlUb2ZZ4
Pega nas mãos e atira-as à água. Sente
como a água está fria – e como te afaga as mãos e inaugura os olhos para o dia
claro. Revista todas as latitudes do céu. Descobre a luz cintilante que se
decanta através das nuvens finas. Abraça-te. Sente o teu corpo, o tumulto que
dele se apoderou e o fez mais alto que todos os outros corpos juntos.
Agora: mete as mãos na terra húmida. Na
terra que um aguaceiro de verão cuidou de humedecer, enquanto te aproprias do
odor extasiante que vem da terra molhada. Vê as tuas mãos saírem da terra,
docemente encardidas pelo elemento maior, granuladas pela terra molhada. Não
reprimas a luz circundante. Rejeita os olhos que parecem querer declinar os
nutrientes férteis que da luz irradiam. Pois sabes que os olhos cerrados sobre
as suas pálpebras alojam os sonhos que de sonhos não cuidam de passar. Abres os
olhos: um gesto singelo, ao mesmo tempo uma aventura sem precedentes. Removes
os sonhos do seu pedestal. Devolve-os à terra húmida que as tuas mãos acabaram
de congraçar. E sabes que os sonhos desceram ao lugar onde todas as coisas são
fungíveis, onde a matéria é sensível, o lugar onde os sonhos não têm préstimo por
locupletarem o tempo tão raro.
Os olhos que descem do céu, alimentados
pela luz clara, e as mãos encardidas pela terra humedecida, são a combustão
necessária para o segredo a que não podes negar o rosto. Os sonhos desceram à
terra. Ou foste tu que chegaste aos sonhos, pouco interessa a distinção. No céu
galanteador as nuvens encenam uma coreografia para se porem a jeito de uma
subliminar mensagem – uma mensagem que só tu consegues reter: “os sonhos já não
o são”. O sortilégio da perseverança trouxe-te ao cais mareado onde as pedras
de musgo enfeitam os dias, todos os dias vindouros, com um feixe de luz
sumptuosa.
Os sonhos – sabe-lo com garantia –
tiveram aterragem segura. Desfizeram-se da indumentária onírica e
constituíram-se matéria sensível.
1 comentário:
Sublime ...
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