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Fervente, a boca esfumaça. As cinzas
atiradas para o ar não são bom presságio. O gigante, afinal, não estava
adormecido. O rugir que vem das suas entranhas é a prova. À volta da boca
fervente, a pele negra e árida está febril. Estremece. O rugir das entranhas é
como se o gigante avisasse de uma alvorada zangada.
À volta da boca fervente, o pânico começa
a subir aos olhos. As pessoas não dormem. Têm medo que a boca fervente expluda,
que se transforme numa boca de fogo. Têm medo que o gigante abra os olhos e
decrete a impiedade – talvez por ter esgotado a paciência pelas coisas do mundo
que não andam de feição. Uma noite, estava pouca gente de atalaia, o gigante
ergueu-se e tomou a palavra estrepitosa. Já não lhe chegava o bramido interior
nem as franzinas cinzas que atirava cá para fora. À boca de cena assomou a febre
indomável. Das entranhas veio um vómito lancinante. A boca encheu-se de fogo.
Vomitou os anos todos de apoquentações reprimidas. Da boca, o fogo incensando a
pele em redor. Como se fosse uma operação cosmética, a epiderme passando pela
metamorfose dos elementos.
A boca de fogo avisava para ninguém se
achegar. Esteve dias a fio a vomitar pedaços de fogo, para mostrar como tinha
as entranhas incineradas pela amargura arquivada por anos a fio. Não conseguia
conter a ira pelas tropelias do mundo. Era o que diziam sacerdotes e
curandeiros em pregações dionisíacas a incréus e crentes de religiões várias,
pois todos estavam tomados pelo medo. As entranhas da terra vingavam-se da
maldade humana – diziam, deixando vestígios apocalípticos nas palavras. O
frémito de fogo que descia pela face tisnada do gigante já não hibernado
escorria pelo resto do corpo. Pegava fogo ao que estivesse no caminho. Era o
gigante a fazer mal a si mesmo, para que não dissessem que ele era o vértice de
toda a maldade. Era fiador da sua maldade e tutor da destruição de uma amostra
do mundo. Para mostrar ao resto do mundo que não devia tratar mal o mundo que
se quisesse um imenso campo de flores vicejantes.
Depois do vómito de fogo sobrava a
paisagem desordenada, transfigurada. E para não dizerem que a boca de fogo era
a personificação de Lúcifer, depois viria um fértil aluvião onde as pessoas
podiam renascer.
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