Noiserv, "Palco do tempo, in https://www.youtube.com/watch?v=he-nceylej8
Sabes? É neste palco que nos movemos. Um
palco onde esbarramos na tirania do tempo: ora vagarosa esperança do porvir
diferente, ora punhal afiado na carne ensanguentada pelo pretérito que merece
olvido. Deitas os lábios à fonte do tempo. Eles vêm molhados com os nutrientes
que por dentro de ti abonam a alforria que não será a destempo. As curvas
deixam de ser um ardil. Os montes não são aqueles medonhos promontórios que
julgavas não saber subir. Às tuas mãos, vigilante deste oráculo, os rios
dir-se-iam trazer uma água prateada. Nesse caudal, resguardadas do olhar ávido,
só palavras em forma de sortilégio. O tempo é uma medida que deixa de ser
tirania. Pois o tempo na sua medida futura é um vasto prado vestido de centeio coreografado
pelo vento vertiginoso. Esperas que o tempo seja recompensa. E sê-lo-á. Porque
ele não admite os fracos de espírito em seu umbral. Ele reserva o pedestal para
os que sabem manter o olhar no firmamento, limpando as lágrimas que marejam o
olhar quando por dentro as consumições fazem arder as veias. Não: não podes
deixar que o tempo faça abater as asas negras de um abutre disfarçado de serafim.
Estendes a mão e derrotas os demónios que o tempo traz em sua madraça cortina.
As tuas mãos, as fortes mãos que não desistem, agarram as cortinas de fumo e
limpam o céu, que fica a estrelar, esplendoroso. É quando o tempo passa a estar
sitiado dentro de ti; e deixa de ser o tiranete que aplacava a vontade e fazia
medrar lágrimas inúteis. Agora que o tempo vindouro assoma em forma de
acetinado céu, sabes que tens a recompensa a abraçar o teu regaço. Há quem lhe
chame justiça divina e diga que é daquela estirpe que não demora. Há quem lhe
chame centelha do tempo por haver, desembainhada dos dedos que não capitulam à
desesperança. Desse tempo que vem na forma de terapêutica.
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