Virginia
Astley & David Sylvian, “Some Small Hope”, in https://www.youtube.com/watch?v=Tzqje3V__T8
Não era o sono que
derrotava a esperança. Podiam os olhos fechar-se no descanso necessário, que as
núpcias prometidas aos planos forjados a ferro ficavam pendentes no estirador
dos desejos.
Sabia da míngua de
probabilidades. A esperança era um módico, uma pequena centelha incensada no
fundo de um poço por onde o olhar indagava. Sabia que as peças montadas no
tabuleiro jogavam a seu desfavor. Sabia disso tudo. E sabia que os desenganos
de outrora cuidavam da prudência, que não houvesse esforços mentais metidos num
desejo que podia ser desatendido. À falta de melhor, fermentava a esperança
pequena, um nenúfar de onde refulgiam luzes maiores sobre um amanhã qualquer
que viesse, emprestando-lhe a luz apetecida.
A fragilidade da
esperança não destemperava a tempestade que se adivinhava. A tempestade que
viesse. Nada se pode contra a força hercúlea dos elementos, às coisas que a
vontade não consegue dominar. Mas há os despojos da tempestade. Esse é o tempo
que conta. E não estava a pensar no pleonástico adágio que o povo tratou de
convencionar, o adágio que ensina a ordem natural das coisas que põe uma
bonança na posteridade de uma tempestade. Intuía, apenas. Intuía que os passos
trocados, as portas erradas, o avesso das encruzilhadas, não podiam ser
imorredoiros. Se lhe perguntassem se tirava as medidas do seu ser por uma
bitola risonha, diria antes que essa era uma bitola bisonha. Não tratara de
aprender com as asneiras. Inábil, ou apenas demoradamente inexperiente, às
vezes sentia que à existência se negava o rosto mais sorridente de um fado.
Não capitulava. Não era
pelos sucessivos contratempos que a vontade de continuar hibernava. Pois a
esperança, ainda que em formato pequeno, persistia como uma pequena, mas firme,
estrela a cintilar no firmamento. Nem que o céu estivesse plúmbeo, e a
tempestade pusesse as coisas em sobressalto, sabia que aquela pequena estrela
não desistia do seu lugar no céu bem alto. A estrela sussurrava ao ouvido, para
ninguém ouvir, que a sua hora haveria de ter lugar marcado no calendário. Tomava-o
como uma profecia sibilada por uma doce sereia que descia do céu.
Até lá, medrava a
esperança pequenina.
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