Interpol, "All the Rage Back Home", in https://www.youtube.com/watch?v=-u6DvRyyKGU
Há uma terra onde cinquenta
cêntimos chegam para comprar granadas de mão. Vinha no título de uma notícia. Não
li a notícia. Não quis saber onde se trafica tanta desrazão. As vidas,
porventura, valem tanto como os despojos de uma casa deitada abaixo por ser lúgubre.
Ou como os ossos deitados fora, depois de desmanchadas as carcaças das reses abatidas
no matadouro. Ou talvez seja pior: é que uma vida de gente não vale mais do que
cinquenta cêntimos, os mesmos cêntimos que são precisos para comprar uma
assassina granada de mão. Já as reses, depois de desmanchadas no mortuário que
são os matadouros, são vendidas por mais dinheiro.
Seria altura para ditar
para a ata, em jeito de protesto pueril (porque adolescente), que a humanidade tem
a soberba da autofagia. Não precisamos de inimigos: somos os nossos maiores
inimigos. Talvez seja da arrogância própria de quem se situa, na escala das espécies,
num trono que exala uma superioridade antropocêntrica. Faz falta concorrência. Fazem
falta outras espécies em demanda pelo domínio do planeta, ou pelo menos de
pedaços dele. À falta de concorrência, a espécie que domina passa o tempo no
passatempo de liquidar alguns dos iguais entre si.
Continuação da
ingenuidade: os cartapácios que ensinam os modos decentes da existência proclamam
a igualdade entre iguais. Uma vida não tem semelhante, é única. Mas, talvez por
sermos tantos, e porque alguns não aprenderam pela cartilha da tolerância,
assomam-lhes ao nariz uns ventos de desrazão que desmentem os preceitos da
igualdade. Apoucamos os que são diferentes entre iguais da mesma espécie. Quando
a corda se estica e os vapores da desrazão embaciam as emoções, tratamos dos
assuntos à força da bala, ou à força de granadas que têm o aviltante preço de
cinquenta cêntimos.
Como pode o pessimismo
antropológico ter o seu degelo se com o correr do tempo vêm à tona manifestações
de soez desrazão?
Sem comentários:
Enviar um comentário