Santigold,
“Lights Out”, in https://www.youtube.com/watch?v=G9WRSO7YYco
Nos filamentos da lâmpada
não há sinal de fragilidade. Não é como aquelas lâmpadas que estão por um fio,
literalmente, e o fio mais débil se rompe, extinguindo a luz. Porém, a luz
vertida pela lâmpada tergiversa. Dá a entender que a escuridão pode substituir
a claridade, a qualquer momento.
Inspeciona a lâmpada.
Parece estar tudo a funcionar bem. Talvez por dentro da lâmpada haja elementos
corrosivos que adulteram o seu funcionamento. Talvez possa haver um defeito de
fabrico, estrutural. Mas não importam as causas da anomalia. Sabe que se a
lâmpada não for substituída ficará refém das trevas: é noite. Não demora a
procurar lâmpadas novas, e de preferência daquela medida, que possam estar
algures na casa. Mexe e remexe em gavetas, nos armários para onde é atirado,
com desprezável negligência, tudo o que seja aparentado de ferramentas e
utensílios de bricolage. Não há sinal de lâmpadas novas.
Ao longe, na sala onde
deixou a lâmpada fosca, nota as vacilações da luz que a lâmpada irradia. Até
parece um corpo senescente nos seus derradeiros lampejos, quase a ir-se, a
custo entretecendo o que serão os finais suspiros. A luz desmaia, mas ainda não
se apagou. Tem algumas intermitências: apaga-se por um instante, menos do que
um segundo, e retoma logo a seguir, ressuscitando um fulgor efémero. Continua
sem encontrar a lâmpada substituta. Põe a hipótese de mudar uma lâmpada que não
esteja acossada pela hibernação, retirá-la de outro candeeiro onde a luz não
faça falta. Só que o candeeiro que alberga a lâmpada fosca é único nas medidas.
As outras lâmpadas não cabem no bujão do candeeiro.
A inquietação cresce com
as tergiversações da lâmpada, cada vez mais frequentes. É naquele lugar da casa
que a luz é precisa naquela noite. Não é noutro compartimento. É lá que a luz
tem serventia. Se se apagar, nem para fosca tendo uso, a lâmpada será
responsável pela impossibilidade da empreitada anotada para aquela noite. Ele
transpira por efeito dos nervos. A lucidez descompõe-se. De repente, rompe com
os hiatos de entendimento. Afinal, esquecera-se do óbvio: as irregularidades na
luminosidade vinham do abastecimento de energia.
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