22.9.15

Os filhos do chão

Arctic Monkeys, “I Bet You Look Good on the Dance Floor”, in https://www.youtube.com/watch?v=pK7egZaT3hs
Sufragam o fastio da vida sempre depressa. Tomam as asas de um pássaro desvairado e voam entre as nuvens, escondendo-se de si mesmos. Julgam-se por um espelho mais alto do que a sua estatura. Não corrompem a verticalidade em troca de duas tentações que se lhes ofereçam. Querem ser tutores dos céus, de onde dão retaguarda, sem absoluto paternalismo, aos que são mais queridos.
Sacrificam-se. Hasteiam bandeiras que não são suas, tamanho o voluntarismo e a ingenuidade próprios da genuinidade a que se abraçam. De vez em quando, sofrem com as desilusões. Por não terem sabido acautelar os custos previsíveis de um passo que, visto de fora, dir-se-ia ser maior do que a perna que o deu. Depois consomem-se em dores interiores. Interiorizando a dor, sem a quererem mostrar para fora das fronteiras de si mesmos. A teimosia vem à tona. Num ensimesmar que confunde vaidade com orgulho (e quantas vezes é tão delgada a linha de fronteira?), fazem de conta, passam muito tempo a fazer de conta. Entram em negação da pungência que os mortifica. Acabam por conseguir derrotar os fantasmas que habitaram paredes meias, em estadia mais ou menos demorada.
Entretanto, continuaram garbosos na exibição da jactância irreprimível, entretecendo os palcos onde continuavam a ser protagonistas. Poucos terão sido capazes de notar as nuvens pesadas que se abatiam sobre os seus ombros. Mestres na arte da ilusão, continuavam a ostentar orgulho de terem sido capazes de se fazerem saídos do chão. Num êxtase de autoconvencimento que merecia visitação ao divã do psiquiatra. Pois nem tudo é centrípeto às suas pessoas, nem o voluntarismo que quadra com o protagonismo diletante chega a ser convencimento pleno de serem o que querem mostrar.
Do chão porventura não terão vindo, como proclamam com orgulho enfático. Em vendo de perto, pela lupa do possível psiquiatra, concluir-se-ia o contrário de um adágio da autoria do povo: a imensa fortaleza em que medram apenas esconde um mar (também imenso) de fragilidades. Pois o chão não é um ninho fértil. O chão é sempre pedregoso, um covil onde se acoitam as mais venenosas serpentes.

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