The
Horrors, “Still Life”, in https://www.youtube.com/watch?v=sJQk0jDZx8o
O
navio sacudido pelo mar enraivecido. Vacila, entre as vagas alteradas. A água
do mar é cuspida contra o convés, varrendo-o de um lado ao outro. A noite está
medonha, a condizer com a tempestade – como se fosse ainda mais
assustadoramente escura. Entre o vai e vem do mar convulsivo, parece que o
navio fundeia nas profundezas do mar quando desce dos contrafortes de uma onda
maior.
O
silvo do vento iracundo soa a um murmúrio dos diabos que entra pelos ouvidos e
fica a percutir constantemente nas ideias. Mas não há tempo para sondar
sobressaltos estes. A empreitada de salvar o navio vem agarrada ao peito. O
comandante mede a sua destreza. Toma o leme do navio enquanto tem um olho no
radar que mostra os humores da tempestade e o outro tenta ler a dimensão das
ondas. Os marinheiros não escondem o temor; por mais que seja a tarimba dos
mares, não esquecem o rol de histórias de naufrágios ou de navios desaparecidos,
engolidos por uma tempestade inominável. Todavia, não capitulam. Metem mãos à
obra. Cada par de braços faz comandita para derrotar os fantasmas que se
sopesam na forma de uma tempestade que desarranjou os mares. Não querem ficar
reféns dos mares. Não querem, menos ainda, que as profundezas dos mares sejam a
sua sepultura. Não perguntam onde foram arranjar forças, eles que já não dormem
há mais de um dia depois de uma noite tão escura passada em branco. Não têm
tempo para essas interrogações. A empreitada não deixa tempo se não para serem
combatentes contra a tempestade que adulterou os mares sulcados pelo navio.
Eles
sabem que a tempestade, por tão duradoura e violenta, pode causar danos
estruturais no navio. Sabem que há um quinhão da empreitada que está à mercê do
sortilégio. E sabem que estão à mercê dos acasos. Tudo o que querem é que
aquele pleito não termine com o ocaso do navio, que seria o ocaso de todos
eles. Continuam de pé, molhados até aos ossos, tiritando de frio apesar do
suor. Porque sabem que a vida vale mais do que todos os sobressaltos que possam
adejar. E, por isso, vão buscar forças ao mais fundo de si mesmos. Pois sabem
que o céu azul há de despontar entre o teto plúmbeo de nuvens que descarrega
toda aquela ira sobre o navio.
Um
lampejo de sol selará o triunfo sobre os malditos diabos que os queriam
arregimentar. Nessa altura, nas suas preces, enquanto agradecem aos deuses dos
mares por os terem poupado, prometerão não voltar a ser embarcadiços. Até se
esquecerem da promessa e voltarem a ser cidadãos dos mares.
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