Pop Dell’Arte, “Ritual
Transdisco”, in https://www.youtube.com/watch?v=sDh4e3TjUjU
(Depois de “O homem irracional”, de Woody
Allen)
Um professor de filosofia, conceituado e polémico entre
os pares, ensina filosofia num curso de verão. Disserta sobre os filósofos que
teorizaram sobre moral. Desafia os alunos a desafiarem os cânones sobre a
filosofia da moral. Os questionamentos sobre a moral são um imperativo. As respostas
não devem saciar a sede de outras interrogações. Um lugar determinado na
filosofia da moral não pode ser um achado, imutável como são os achados quando
quem os achou os toma como proezas. O professor dá exemplos, desafia os alunos
com outros questionamentos que os levem a sopesar o seu lugar perante a moral
filosofada – seja através de Kant, Leibniz, Kierkegaard, Husserl ou Sartre.
Na reviravolta do enredo, o entediado professor descobre
que só consegue ser pessoa em sentido pleno se assassinar um juiz. O juiz havia
tomado tantas decisões injustas que penalizaram uma pobre mulher a quem o juiz
tirou a guarda dos filhos num divórcio. Citando Sartre (“o inferno são os outros”), parte à redescoberta de si através do
plano magistral de um assassinato pensado para não deixar pontas soltas. A jovem
musa que se enamorou por ele descobre as pontas soltas. Confronta-o. O
professor terá de se entregar à polícia – mais a mais, a polícia prendera um
suspeito inocente. O professor não conseguiu antecipar o cárcere e a privação
da liberdade. Passou por cima do exemplo que, em jeito de desafio, fez a um
aluno a propósito do imperativo categórico kantiano: “se escondesses a família de Anne Frank e a polícia nazi entrasse em tua
casa, dirias que os fugitivos estavam escondidos no sótão, só porque a moral
kantiana a isso te obrigava?”
O professor teria razão numa coisa: os calhamaços que
tresandam a filosofia são apenas palavras abundantes, teorizações complexas,
sofisticadas, elegantes, mas sem sentido prático. A filosofia não se aplica à
vida real. Como se acabaria de confirmar pela agonia que o desafiou, mas que
ele olimpicamente ignorou. Fazendo lembrar um adágio popular: “no melhor pano cai a nódoa”. Pois não
era ofício do professor ensinar os meandros da moral (teorizada pelo ângulo da
filosofia) aos espíritos curiosamente jovens e, à primeira curva traiçoeira, acabou
atado na contradição dos ensinamentos com o imperativo do seu bem-estar?
Talvez preço a pagar pela reabilitação para a vida e
correspetivos prazeres, o professor supôs que talvez fosse melhor não ser
julgado pelos atos, mas pelas palavras ditas do alto da cátedra. Tenho para mim
o que sempre julguei assisado: a moral, fora das fronteiras da filosofia. Ou então
a filosofia limitada a uma prescrição minimalista, pois a moral não se
objetiva, devolvendo-a ao mando do subjetivismo.
E não, a filosofia não é um farol esotérico desligado da
paisagem real. Longa vida à filosofia!
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