Low, “Congregation”, in https://www.youtube.com/watch?v=8mGQFnVUGNE
Que não tenha perenidade o tempo malsão em que encontra
ninho a impiedade. Mesmo que seja a maleficência arrematada mercê intervenção
terceira. Ou a maldade que vem depois do crepúsculo, inundada por consequências
de atos exteriores ao indivíduo. Tudo tem a finitude contida nas fronteiras que
o delimita. Tudo encerra o seu cansaço: as palavras que amesquinham e os
olhares que vituperam o que navega fora dos limites desses olhares.
Um homem tem de encontrar o seu tempo para a bondade. Sem
ser apoderado pelo receio da morte, quando a morte amedronta os vivos com o limbo
antes de chegar o inferno. Sem ser a não ser porque a rotina da língua viperina
é uma rotina como outra qualquer, extenuante, um tempo relapso que só interessa
colapsar. A bondade sem o lustro de lições de moralidade entretanto apreendidas
em calhamaços vetustos. A bondade sem o vinco da consciência imersa numa
cambalhota, tomada pelo arquétipo da indulgência.
A bondade sem peias. A bondade porque apetece. Pregada por
intermédio da tolerância. Dos outros que, ao contrário do filósofo, não são o
inferno. Tomando por junto os pedaços de tudo o que aprouver, desde as coisas
complicadas às mais singelas, desde os pronunciamentos solenes que prometem mudança
às proclamações mundanas que vão fazendo o caminho cinzelado nos contrafortes
do pensamento. Sem tempo para a polémica desmazelada. Sem tempo para as
inquietações febris que lamentam as linhas soezes por que outros se deixam
cozer. Sem tempo para a sátira gratuita, deixando de lado os artistas de artes
várias e as personagens públicas que, antes da reviravolta heurística,
levitavam como pessoais irritações.
O homem bom sorri. Resigna às carantonhas que o lívido
mundo lá fora teima em emprestar. Vai rumando contra a maré. Vai abraçando as
pessoas queridas no calor do corpo. Dedica-lhes as águas inspiradoras dos
afetos. É domador das águas tempestuosas que ameaçam a destemperança. Não troca
a doce planura dos lugares serenos por um covil onde os sobressaltos são idioma
dominante. O homem bom é isso, bom. Depurado da idiossincrasia plúmbea que trazia
o olhar de soslaio ao que lhe era exterior. Perdendo, ato contínuo, as
coordenadas de si mesmo. O homem bom demite as contrariedades. Despindo-se do
acessório, só dá conta do que lhe é nuclear. É um bom homem.
Aprendeu com o tempo que só é malsão se deixarmos que assim
seja.
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