11.2.16

Da esperança

Explosions in the Sky, “First Breath After Coma”, in https://www.youtube.com/watch?v=w0o8JCxjjpM
E pode-se fermentar a esperança sem que ela se emaranhe num sonho, daqueles sonhos que medram na irrealização?
Frequentemente, sobretudo quando as más aves se abatem sobre o horizonte e ameaçam com o desabamento de tudo, convoca-se a esperança. Diz-se, em metódico autoconvencimento, que tão más andam as coisas que só podem ficar melhores. A esperança no seu derradeiro reduto. Quando já não há mais nada para convocar, quase como se entoasse uma prece desanimada e a aflição se confundisse com uma esperança malparida.
Mas há outra esperança. Outras esperanças. Esperanças que intuem a derrota das nuvens plúmbeas que acabaram de tomar quartel, sem que dessas nuvens venha cominação medonha. Ou das esperanças genuínas, mesmo daquelas que exigem que o palco do mundo fique mais apresentável, apesar de se lhe reconhecerem credenciais recomendáveis. Há algum mal na exigência? Algum mal que a ambição das coisas boas não se contente com as boas coisas quando elas podem ser aferidas por mais alta bitola?
Seja qual for o calibre da esperança, seja qual for a motivação que lhe dá andamento, a esperança é uma provisão preferível ao método de desafazer tudo o que tenha existência. Até pode haver, nesse ceticismo militante, fundamento; só que, às vezes, por mais fundamentado que seja, o ceticismo militante é exasperante, provoca náuseas, não prefigura soluções. Nem que seja através do cansaço, ou de como um ceticismo tem alavanca para derrotar o ceticismo que vem de trás (portanto: ceticismo que motiva ceticismo de sinal contrário, um ceticismo positivo – por assim dizer), incensa-se a esperança. A esperança que desabotoa os fechos herméticos da desaprovação de todas as coisas em geral. A esperança que frui do nada, porque as cinzas depostas abrem feridas e ninguém, no seu bom juízo, se presta ao papel de eremita insensível aos pesares que lhe cabem.
Pode-se confundir a esperança com sonhos. Daqueles que sabemos rasarem o chão na escala das probabilidades. Daí não vem grande mal ao mundo. Ao menos, os olhos não se consomem na penumbra ácida que mantém um desrazoável pirronismo das coisas. Contra ele, esgrime-se a esperança a rodos.

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