Einstürzende Neubauten, “Stella
Maris”, in https://www.youtube.com/watch?v=dYmRnl_J9GI
Quero as coisas todas que quero. Na ilimitada ambição adestrada
pelos limites das possibilidades. Mas quero-as, todas. Intensamente. Saber tê-las
nas mãos, decifrar o seu código genético, extrair delas a seiva que consigam
oferecer, a elas dar o ouro que trago em mim. Quero ler nas entrelinhas. Reler as
palavras e não ceder à tentação de as tresler; ou, caso seja oportuno, procurar
sentidos ocultos nos interstícios das palavras, revisitar a sua hermenêutica,
redescobrir sentidos embaciados nas palavras; reinventar o mundo que é o chão
dos meus pés. O que tiver de ser, no tempo que for alistado.
Quero saber que o conhecimento que interessa é o que
procurei. E quero ter o desprendimento para saber que fora desse conhecimento há
outro, muito maior, que irradia fulgor. Quero saber que hoje sei o que sei e
que amanhã posso trazer das sombras da memória a curiosidade por um
conhecimento que era anónimo, ontem. Quero ter as lentes necessárias para
decantar as formas de conhecimento que julgar precisas. Para não cair na
letargia.
Quero usar cortinas que não deixem aos forasteiros saberem
quem sou. Ou: levantar uma nesga das cortinas, só a necessária à possível expiação
de mim através das palavras que escrevo. Sem passar dessa medida. E quero usar
cortinas em sentido contrário, para desembaciar os olhos e deitá-los ao
conhecimento do mundo, das coisas que aprouver, dos lugares ditados por
escolhas sem critério, das artes sumptuosas ou apenas diligentemente singelas, sem
deixar para trás muitos oxalá em forma de arrependimento.
E quero, no púlpito de tudo isto, viver num êxtase
total. Dar tudo a quem seja merecedor de mim. Não desviar a atenção para as matérias
acessórias que são um atalho para lodaçais a precaver. Cobrir a aura do dia com
os beijos apaixonados pela vida, pois sem assim ser não há critério para
emprestar grandeza às pessoas e às palavras e às coisas a que me abraço. Quero
querer. Em querendo com a fundura que vem da palpitação tremente, dos olhos tremeluzentes
irradiando um apego pela vida e um medo pela sua antítese. Quero saber-me rei
de mim mesmo na pequenez que sou perante a imensidão de gente e a imensidão
maior de ar e de terra à volta. Sem que a grandeza seja sinónimo de máximos
imaginados diante de um espelho, que as cortinas despejadas da frente dos olhos
mandam tirar as medidas certas ao tamanho que sou.
E quero, contra a maré dos lugares-comuns, dizer que cobiço
a perfeição. Pois não creio que haja quem erre por vontade própria, com o propósito
de confirmar o lugar-comum das desvirtudes de si. Sem ter a espreitar, num
espelho vítreo, uma figura narcísica, demoníaca, a povoar doses excessivas de
indulgência.
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