19.2.16

Da inveja

Tochapestana, “Macho masoquista”, in https://www.youtube.com/watch?v=gNCWdRGhEVg
A propensão para medir o eu pelo perímetro dos outros é uma cilada. A inveja é um dos seus vários maus resultados.
Só há inveja porque, primeiro, não há contentamento com o eu. É o mote para o segundo deformidade de feitio: a auto-insatisfação condensa os vapores de uma sempre medíocre inveja. Pelo caminho, o cobiçoso é atraiçoado pela falácia da inveja: de tanto querer medir a sua bitola pelo perímetro dos outros, e em não conseguindo o desiderato de o ser (ou daquilo que eles representam), esconjura-nos. Não percebe a sublime aleivosia de que é vítima: ao invejar quem queria ser, acaba por se detestar a si mesmo. Se espuma raiva dos seus pessoais alvos de inveja, mas ao mesmo tempo ambiciona ser como eles, é como se detestasse à partida. Não há surpresa na diagnose. O que move o invejoso, ao pretender ser um émulo de outrem, é o descontentamento de si. Antes da casa da partida, já não garante boas credenciais.
Da casinha muito pequena onde habitam, não chega a lobrigar as consequências da inveja sistemática. Correndo os riscos das generalizações, pode-se extrair a lei de bronze da inveja: ela cresce na exta proporção da falta de inteligência. Por mais que medrem frustrações com o tempo já pisado, por mais lamentações que corroam as veias pelo que se é ou pelo que não se chegou a ser, é de escassa inteligência intuir que, num passe de magia, se pode vir a ser quem se gostaria de ser. Pelo caminho, paredes meias com a inveja e a ignorância impante, frui a falta de pontos cardeais. O disparate é abundante, selando a ignorância. A miséria das almas fica exposta ao olhar público quando não se escondem as pretensões de ser quem se não é. O somatório da miséria das almas com o disparate abundante converge na malícia, que é o fermento da inveja.
Esta é uma doença de cura fácil. O invejoso não o seria se não se convencesse que tem muitas angústias a adejar sobre si, angústias que – acredita – só podem ser resolvidas se conseguir imitar outrem. Em não sendo possível aplacar as frustrações, o receituário para evitar o achaque da inveja seria recusar ser-se ostensivamente apedeuta ao ponto de pretender ser quem não se é. Se nem isso for possível, ao menos devia o invejoso evitar a lama que atira a si mesmo quando desdenha de quem inveja.

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