Last Shadow Puppets, “Bad
Habits”, in https://www.youtube.com/watch?v=sYdHiPZNbO0
Ferve a verve que o torna iluminado. Uma farta fatia da
sua autoridade encontra aí esteio. Tomando posse do leme, não mais o desagarra.
Cimenta o altar em que se coloca, sagrada vaca, intocável personagem que não admite
titubeações à sua autoridade. Se preciso for, ostenta nas fisionomias alheias a
autoridade, para que os súbditos percebam quem a detém. Vai dividindo o reino
em pequenos talhões de delegada autoridade, virando os tutores de cada talhão
uns contra os outros com o desiderato de sublimar o poder nas suas mãos a um
pináculo inamovível.
Em barro os divinos pés não toleram vicissitudes que
hipotequem o decretado através de sua ungida mão. Ai de quem levantar um mínimo
dedo para o desafiar: depressa condenado ao degredo maior, pública humilhação tão
aviltante que com apuro a vítima se consegue endireitar da lama para onde foi
atirado. Mas o déspota aparenta não o ser. Ensina boas práticas em público. Discorre
lautas lições de moral, para arregimentar seguidores convertidos à inércia, ou
no máximo à obrigatória genuflexão.
Saberá o déspota que o respeito dos demais o obtém mercê
do medo que neles semeia. Não imaginará que este não é critério elogiável para
concitar respeito. É temido; não é respeitado. E nem a retórica que ludibria os
incautos, cosmética da praxis
incorrigível, chega para despir as vestes autocratas. São-lhe já genéticas. As lições
soçobram na oratória de confessionário. Um par de olhos atentos ao chão por ele
pisado e aos decretos com a sua chancela bastam para aluir a máscara dos
embustes.
Um déspota é um déspota. Não se corrige. Está-lhe no
sangue.
A máscara dos embustes! Se as palavras proclamadas são hinos
à polis ideal onde todos seriam
ordeiros filiados num rebanho apascentado por um notável e respeitado homem do
leme, depressa a praxis engole as
palavras, destinando-as ao promontório das boas intenções que cimentam boas lições
sobre boas práticas. O que sobra é um largo manto de torpedeamentos ao calhas,
atingindo os destinatários que aprouver para, em cada momento, se ostracizar
como oligarca sem descendência – o pior dos déspotas.
O pior, é que nem os déspotas conseguem fugir a Tanatos.
São efémeros, como todos nós.
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