12.4.16

O que diremos amanhã?

Queens of the Stone Age with P. J. Harvey, “Make it Wit Chu” (Live at Jools Holland), in https://www.youtube.com/watch?v=S2JDV_T3Kmg
Sem as peias que embaraçam os braços. Sem deixar o olhar turvado nas gotas finas do nevoeiro de novembro. Sem transtornar o tempo fruído, nem frear o tempo prometido por oráculos ocultos. Sem palavras hipotecadas. Nem sentidos embaciados por tempestades que levitam no horizonte onde, madraços, fantasmas obstinados persistem em adejar. Sem nada disto, ou outro tanto de igual jaez, como contratempo das nossas mãos. Porque contamos como entidades supremas, únicas, como se a certa altura o mundo inteiro fosse pequeno para alojar a imensidão que frui de dentro de nós. Amamos intensamente. É o remédio.
Sabemos, de fonte certa, que as águas frescas que correm dos mananciais desatam os nós que obstruem a lucidez. Vamos à margem do rio e recebemos o frescor das águas, como se fosse necessária fonte de inspiração. Pois sabemos que as trevas que persistem são derrotadas com a algidez das águas mansas, um banho medicinal que desfaz sobressaltos em contramão. Depois, trazemos nas mãos as flores campestres, que permanecem frescas a viçosas enquanto estiverem resguardadas no conforto das mãos.
Chegamos à cidade, o lugar onde estão mil olhos atentos, ou talvez apenas indiferentes – e, contudo, olhares presentes. Deitamos as flores ao alto. Elas vão alimentar uma chuva miúda, perfumada, uma água propícia que se deita sobre os nossos cabelos, molhando-os. Damos as mãos, em contínuo amar intenso. Os cabelos molhados não se intimidam com a chuva miúda e perfumada. As mãos entrelaçadas protegem-se da chuva, continuam secas e quentes. Ao fundo da rua, sem sabermos o que esperar da encruzilhada, temos a certeza que vamos meter os corpos pelo caminho acertado. Assim nos sussurra uma voz quente, promotora de um oráculo que nos aparece em sonhos. O dia que veio com a alvorada fresca traduz os sonhos em matéria sensível.
Somos nós, deuses em pessoa, autores e intérpretes de uma voz singular, uma voz em uníssono. Somos nós, matéria sublime de nós mesmos. Levantando ao alto o altar mais alto de onde nos despojamos para sermos pureza em nós. Amando intensamente.

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