14.6.16

Cetro


Protomartyr, “Come & See”, in https://www.youtube.com/watch?v=F2vUPp-Ffho
Com as mãos erguidas ao céu, pedindo reconhecimento às divindades, alteiam-se as proezas. Ufanos, como se na brevidade de um instante se julgassem casta, representação de uma elite, empunham o cetro que sela proezas. Desconhecem que elas são indiferentes a toda a gente fora deles. Talvez porque as outras pessoas são atiradas para o jardim da irrelevância. Talvez por um narcísico ensimesmar que só deixa ver para dentro, os atos celebrados como proezas é que contam. São proezas porque foram eles a consegui-las. Fossem os outros e não seriam se não a expressão de um módico de humanidade. O cetro correspondente é zelosamente guardado. Merece a glória e o tratamento cuidado que as coisas valiosas merecem. O cetro, como se fosse uma joia de incalculável valor, autentica o orgulho supremo. Serve para afiançar um pergaminho diferente, pelo menos para o autocentrado autoconvencimento de que se julgam credores. Só não sabem que o cetro cega. Liquida as expetativas de lucidez. Atira-os para uma ilha isolada onde, por erro, acordam a acreditar que são únicos entre os demais. Toldados pela luminescência que julgam ser aura a irradiar das suas imensas pessoas, não lhes é dado a perceber que cetros destes são ardilosas maquinações de que são fautores sem darem conta. Fautores e vítimas, numa conspiração sem rosto que passa pelos dedos insentidos que orquestram uma imagem ampliada que não confere medida com a estatura. A história está repleta de endemoninhados que se enamoraram pela imagem falsamente seráfica de um cetro como personificação de uma grandeza por mais ninguém reconhecida. Pois há quem se julgue amesquinhado pelo anonimato. Há quem viaje em fulgurantes arremedos de um eu projetado por cima do céu, por carência de atenção (de que se julgam merecedores). Constroem castelos no céu. Sem esteios que os amparem. Quando acordam dos sonhos, estatelam-se no chão. E vêm como o cetro se despedaça ao atingir o chão.

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