16.6.16

Iluminados

Parquet Courts, “One Man, No City” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=7UYm61bsM14
Quem pode tirar um verbete ao conhecimento, se o conhecimento é acenado com tanta prosápia? Os senhores das certezas, das certezas que não admitem contraditório, vulgarizam o que certificam ser a nulidade intelectual dos outros. Sobretudo se os outros deles discordam, o crime de lesa-majestade com que não condescendem. O melhor critério para apoucar os que deles discordam é: primeiro, tomarem o púlpito da sabedoria, nem que tal pergaminho seja apenas certificado por eles, do alto da sua presuntiva presciência; segundo, e como consequência do anterior, esmagar os que têm o topete de discordar, reduzindo-os ao vexame do apedeutismo.
Quando os iluminados vão a caminho da provecta idade, a pesporrência torna-se maçadora. Em cima do estatuto, (auto)presumido, de estrelas do conhecimento, junta-se o gabarito da idade. Sabem muito e sabem mais porque já levam no lombo uma considerável experiência de vida medida pelo número de aniversários festejados. Elevam-se a um olimpo da sabedoria e ai de quem vier dizer coisas em contrário. Os dissidentes são apedrejados por uma multidão que vem em socorro do magnata da sapiência; quanto mais não seja – argumenta-se, em tom ofendido – não se bule com gente já idosa. O que estes senadores de provecta idade proclamam está à margem de contestação. Como se os sábios idosos não pudessem ser contestados sob pena de, ao tomarem conhecimento da retórica dos dissidentes, serem acometidos por uma apoplexia.
Há uma categoria recente que sublima o insuportável: gente de meia-idade, ou a caminho da terceira idade, que tardiamente descobriu o conhecimento que habilita a grau académico. A humildade do estatuto de aprendizes não cabe na sua bagagem, pois trazem consigo um lastro de “experiência de vida” que consideram esmagadora prova de conhecimento. Dispensam-se (ou acham que devem ser dispensados) de provar o conhecimento. Talvez por estarem dispensados de provar sabedoria, são ostensivos na exibição de uma sapiência que, julgam, os eleva ao púlpito do conhecimento.
Quando esbarro nestes próceres do conhecimento categórico, lembro-me de protestar o lugar-comum filosófico (do Sócrates que interessa): só me apetece nada saber. Sem, contudo, aceitar conhecimento quando os iluminados o ostentam em preparos autistas.

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