Thievery Corporation, “Lebanese
Blonde”, in https://www.youtube.com/watch?v=04bg9IC9N6w
Chegara ao capítulo seis sem passar
pelos quatro anteriores. Saltou diretamente do primeiro para o sexto. Julgou que
podia cometer esta ousadia. Podia ser que corresse o risco de se ausentar de
partes substanciais do enredo, pois sempre eram quatro capítulos obnubilados;
quatro dos sete capítulos (sabia, de antemão, que terminava no sétimo capítulo).
Podia ser um daqueles enredos em que o autor adverte, de começo, que os capítulos
podem ser transitados por ordem aleatória. Não há muitos assim, mas há. Ou talvez
fosse apenas a habitual irreverência a pôr-se ao serviço de um – por assim
dizer – anti método da leitura.
Quando terminou o primeiro capítulo,
leu apenas os dois primeiros parágrafos do segundo capítulo e ficou assanhado. Até
podia ser que a parte sumarenta do segundo capítulo viesse mais tarde – e sabia
que é preciso ter paciência, na leitura como em tantas outras coisas maiores da
vida; mas não apeteceu esperar; havia algum fastio, pelo menos a julgar pelos
critérios que estavam a sopesar aquele dia, terminados os dois primeiros parágrafos
do segundo capítulo. (O que podia querer dizer que se o segundo capítulo
começasse a ser lido noutro dia, talvez o levasse a eito, talvez fosse dia para
ancorar os sentidos à necessária dose de paciência.)
A decisão estava tomada. Saltara, de
uma vez só, quatro capítulos. Assim como assim, ficavam a faltar dois para
terminar. A meio do capítulo, começou a ser assaltado por inoportunas
interrogações surgidas do vazio: teria sido sensata decisão meter os quatro capítulos,
entre o primeiro e o sexto, num imenso parêntesis, como se houvesse um deserto
que não interessava frequentar? E se nesses capítulos houvesse matéria que
fosse compensadora, episódios para depois recordar? Não o saberia. Não queria
saber. Arriscara saltar aqueles quatro capítulos. Não aceitava retroceder na
decisão hasteada.
De repente, algumas lembranças vieram
à tona. Lembranças sobre o que de si ficara escrito no imenso livro que
compulsa as existências de todos. Dele se desprendiam fragmentos sobre a pressa
de viver, sobre a impaciência geral que era conduta enraizada, sobre os saltos
no vazio que dera, sobre uma certa imprudência em forma de propensão para o precipício.
Era um pouco como o método para ir, num imenso passo só, para o capítulo seis.
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