Nine Inch Nails, “Right
Where It Belongs”, in https://www.youtube.com/watch?v=uhhcbDQ4eWU
Atira-se o sal dourado por cima das
ondas, que trepam por cima do vento e querem arrimar depressa à praia, seu
cais. O mar esbarra na linha de areia, quando parecia querer engolir toda a
terra por diante, tão iracundo se assemelhava. Nas ondas hasteadas sopra um
rudimento de calma. Nas ondas hasteadas há a luz inteira que desautoriza o
olhar mortiço. Sem saber por onde anda o tempo fugidio, o mar desembacia a
penumbra contumaz.
Há sempre serventia em interrogar os
humores do mar, por entre dois dedos de espera e um olhar que se refrange sobre
o ombro cansado. Pois do mar esperam-se os predicamentos maiores, a demissão da
estultícia teimosa, palavras-bastião que interrompam o silêncio condenado, um
olhar macio que traz calor à imensa alma assim recuperada. Da lassidão das
nuvens que se alimentam no mar tremendo sobram os vestígios de ternura que se
depõem à volta da mesa, num banquete sem par.
O mar está no sítio, em todo o seu
simbolismo. O mar temporão, mesmo quando dele dizem vir a destempo. O mar que
traz um quinhão de céu à terra ardente, o mar que despoja o fogo mastim. Entre portas
travessas e janelas-limbo, as mãos metem-se no mar que beija a bordadura da
areia, alimentam-se do mar arrefecido. E depois, o corpo sentado na areia
levantada pelo vento amotinado, contempla a coreografia das ondas, umas atrás
das outras numa sucessão sem ordem, esmagando-se nos rochedos desprotegidos, revoltando-se
contra a partitura dos dias iguais. Os olhos aprendem. Embebem-se nas partículas
de mar que se desprendem e vêm pousar onde o mar já não chega.
É como se o corpo se tivesse enchido
de uma luz intensa, por dentro. Não há fragilidade que se mantenha firme diante
do código do mar simbólico. Não há sombras que resistam à contracultura de um
mar sem freio. Do mar simbólico. Do potentado que é, no desembaraço ímpar que
se desembrulha das ondas majestosas, com a lua timorata por testemunha.
Sem comentários:
Enviar um comentário