In http://www.1freewallpapers.com/natural-park-autumn-red-leaves-autumn-scenery/pt
Havia uma altura do ano em que as árvores se desprendiam
num manto avermelhado, cobrindo o chão com um tapete que parecia um lago de
sangue. Muitas pessoas diziam que as árvores sangravam. Poucas propunham que não
era sangue, que eram lágrimas vertidas pelas árvores. Por mais que a maioria
chamasse a atenção que as lágrimas não são vermelhas; por mais que a maioria não
certificasse maus eventos que trouxessem lágrimas às árvores – estes poucos não
transigiam com as costuras da sua teoria.
Era lugar-comum, portanto: o tapete carmim nas imediações
das árvores era do sangue que elas vertiam quando se chegava àquela altura do
calendário. As árvores portentosas despiam-se da folhagem, deitando no calendário
um quadro bucólico que só acontecia naquele lugar. Numa transfiguração meteórica,
as folhas decadentes viravam-se do avesso e o carmim tomavam conta delas. Num progressivo
desmaio de cor, as folhas ganhavam rugas e maceravam na opulência tardia. Diziam
os mais atentos, estas árvores espadanavam grandiosidade quando a sazonalidade ditava
a decadência da sua folhagem. No resto do ano, eram árvores como quaisquer
outras. Numas alturas, com a folhagem viçosa. Após as folhas caducas, no
anonimato que são as árvores nuas.
A opulência era efémera. Coincidia com um singelo dia: a
degradação de cores, no progressivo desmaio, interrompia-se repentinamente; como
se tratasse de um súbito fulgor, de um volteio final para ficarem emolduradas
na memória dos passeantes, as folhas ganhavam um inusitado tom carmim, ainda
mais garrido do que o verde viçoso que determina a primavera. Os populares
certificavam: era do sangue derramado pelas árvores. Ao verem-se despojadas da
sua folhagem, o sangue derramado preparava as árvores para os rigores do
inverno (porque, exangues de sangue, conseguiam hibernar e meter um parêntesis
enquanto vinham as neves do inverno).
A minoria mantinha, teimosamente, outra teoria: eram as lágrimas
das árvores, cientes que o breviário outonal iria expô-las ao demorado inverno.
Eram de uma espécie insólita: vertiam lágrimas carmim, para marcarem a
diferença entre elas e as outras espécies que conseguem derramar lágrimas. Mas
estas eram pessoas que professavam uma trágica desconfiança no inverno.
Sem comentários:
Enviar um comentário