7.12.17

Acordo de cavalheiros

My Bloody Valentine, “Sometimes”, in https://www.youtube.com/watch?v=1c8Selr9Aec    
Termos em que a barbárie não pode ter vindicação, sob pena de acabarmos com a civilização (pelo menos, como a conhecemos). Os homens que se entendam, ou os termos da resolução deste contrato não afastam a possibilidade de caos. Os homens são lúcidos. As divergências não são o veneno fatal do desentendimento. Que se mantenham as divergências; mal do mundo se elas não existissem, pois corríamos o risco da indiferença entre uns e os outros. Não podem as divergências, contudo, medrar na intolerância. Não podem ser o frémito que, avassalador, cavalga às costas do adversário, depressa feito inimigo. Que os homens se mentalizem: quem assim se comporta não tem noção das medidas e age em perfeita desarmonia com a proporcionalidade.
Talvez os homens não sejam de cepa de forma a tolerarem que haja outros diferentes de si. Talvez o acordo de cavalheiros, nestes termos, devesse contemplar o hermetismo dos grupos. Grupos indiferentes mutuamente. O critério para não sermos reféns do cataclismo das divergências insuportáveis. Os homens que não sejam eremitas. Aprendam uns com os outros. Aprendam com o que as diferenças lhes podem ensinar, usando o raciocínio flexível para não fechar as gavetas onde se alojam os outros. Neste acordo de cavalheiros, ninguém tem de mudar. Ninguém tem de prometer ser diferente daquilo que é. A ninguém deve ser dobrado o braço, em forçosa capitulação que coincide com o ostensivo triunfalismo dos vencedores.
No acordo de cavalheiros ninguém perde e, contudo, todos ganham. É através do acordo de cavalheiros que os homens admitem que o mesmo o sangue circula nas suas veias. Que o pensamento obedece a uma mesma matriz estrutural. E que idiossincrasias estultas não esbatem um património comum. No acordo de cavalheiros não se obliteram as diferenças. Elas são sublimadas através do rufar dos tambores que anuncia um princípio geral de tolerância, no irrecusável alfobre das diferenças. Pois neste acordo de cavalheiros ninguém intui ganhar vantagem às costas de outro, dele precisando como hospedeiro de um triunfo que equivale à sua humilhação.
Que se convençam os homens da vivacidade do acordo de cavalheiros. Que sejam cavalheiros – ou qualquer outro étimo, sinónimo ou não (que interessa a semântica?), que traga os homens para o pináculo da sua humanidade.
Sim: acordo de cavalheiros, porque não custa orquestrar utopias.

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