Massive Attack, “Pray for
Rain”, in https://www.youtube.com/watch?v=pvu2iQXJ30s
Espadas embainhadas. Estaria a
capitular? Uma voz sem rosto murmurava: “faltam
oito minutos para o futuro.” Mas ele não sabia o que era o futuro. Não queria
saber. Não se intimidava com os planos que (diziam alguns, certos do seu credo)
o futuro tinha para si. Não acreditava.
Ao mesmo tempo, uma parte oculta de si
era tomada de assalto por dúvidas: e se o futuro fosse medonho? Era legítima, a
suspeita; a voz sem rosto repetia, cansativamente, “faltam oito minutos para o futuro” – e isso era dito como se
pesasse como uma ameaça. De repente, tomou as medidas ao medo. Ao mesmo tempo,
as partes maioritárias de si (dir-se-ia, as racionais) nem sequer conseguiram
racionalizar o estigma do tempo não respeitado pela voz sem rosto que não
parava de murmurar “faltam oito minutos
para o futuro. Faltam oito minutos para o futuro. Faltam oito minutos para o
futuro. Faltam oito minutos para o futuro”. Não era possível que o tempo estivesse
suspenso para a voz sem rosto repetir à exaustão que faltavam “oito minutos para o futuro”. Se tal
fosse possível, era como se o futuro estivesse parado na medida do tempo, à
espera de uma reação sua às solenes e ameaçadoras proclamações da voz sem rosto,
ou que um plutocrata do tempo fizesse descer a espada do futuro sobre a sua
cabeça.
Deixou de ouvir o murmúrio a percutir
no pensamento. A voz acantonara-se no silêncio. Se calhar, o relógio, em
contagem descendente, tinha sido posto a correr. Já não faltariam oito minutos
para o futuro. Talvez uns sete, ou uns seis se, entretanto, o tempo correu mais
depressa do que a sua temporária anestesia. Sentia-se a caminhar para o rebordo
de um precipício. Se os augúrios da voz silenciada estivessem certos, o
percurso para onde fora empurrado afigurava-se sem remissão. Supôs que não adiantava
tomar diligências para contrariar o relógio em contagem descendente. Era como uma
cabeça de gado a caminhar para o golpe fatal no matadouro – e foi então que
indagou se o futuro que estava em contagem decrescente não era metáfora disso
representativa. “Não, não quero morrer.
Ainda não” – vociferou com a voz tingida pelo pânico, enquanto continuava a
sentir os pés maquinalmente a dirigirem-se para o precipício sem saída.
Foi quando ouviu do outro lado,
escondida atrás de uma montanha, outra voz, não em murmúrio, a informar: “são vinte e três horas e cinquenta e dois
minutos.”
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