Massive Attack, “Atlas Air”, in https://www.youtube.com/watch?v=c61jlHO3rVM
Todos procuram um labirinto. Ninguém gosta que uma safra sem sobressaltos se dilate no tempo. É o pior cansaço. O cansaço invisível, que se insinua sem alojar sintomas, um cansaço do qual se dá conta quando ele morde uma parte grande do corpo.
Os labirintos ensinam a exigência. Todavia, muitos fogem da exigência, fogem apenas ao saberem que a ideia de exigência começa a fruir nos cérebros que se emprestam para a escala superior a que será dedicado o destino mediano. Esta é uma engenharia complexa: a exigência é uma jura de complexidades que se emaranham à medida que passamos de pergunta em pergunta. É uma engenharia que carece de peritos exímios que não há (os gurus das almas, penhores da autoajuda, não entram nestas contas). Sente-se o bafo esclerosado da orfandade.
Às vezes, as pessoas esmorecem a meio de um labirinto. Quando já passaram quatro vezes pela mesma encruzilhada e sentem que andam em círculos, começam a temer que o labirinto seja assimétrico (só tem entrada), ou que tantos corredores que se entaramelam uns nos outros causem uma ilusão de ótica digna de uma miragem. O labirinto talvez seja isso, a ideia de uma miragem. A imagem projetada da miragem engana as pessoas, que eram capazes de jurar que apreciaram o labirinto desde o exterior e que ele não tinha a aparência de ser uma construção ciclópica.
Deixamo-nos atirar para dentro de um labirinto. Ele não é procurado intencionalmente pelas pessoas. As cordas são adestradas por outros, os arquitetos que investem na antítese da autoajuda e estão dispostos a testar as capacidades interiores dos que se prometem a um labirinto. As pessoas cruzam-se na rua sobranceira ao labirinto que poucos sabem que é um labirinto. O chão ladrilhado parece ter uma fina camada de água. As pessoas são ensinadas a caminhar sobre a água e exultam, precipitam-se na autoimagem de alguém que rivaliza com divindades. Os milgares não correm apenas por conta delas. As almas desguarnecidas que se mobilizam num labirinto e são industriadas a reconhecer a capacidade divina de quem anda sobre a água são vítimas de um logro.
Nos labirintos, ninguém é escoltado. Não há mapa que valha ao labirinto. Não há meios auxiliares que ajudem os utentes – não há manual de instruções; não há, sequer, instruções. As desregras impõem-se com a gramática que desmobiliza os fantasmas dos lugares inertes onde exercem o seu domínio. É disso que as pessoas precisam. Não é de suplicar por um decreto socialista que fixe em vinte e três graus a temperatura máxima admitida nos neófitos dias de outubro.
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