19.1.04

A fuga aos impostos - esse cancro social...

Do fim-de-semana, mais uma curiosa manifestação de cumplicidade em favor da luta contra a evasão fiscal. No mesmo fim-de-semana em que o governador do Banco de Portugal deu uma entrevista enunciando as medidas necessárias para tirar a economia da crise. E nenhuma delas preconizava uma luta mais intensa contra os que fogem do pagamento de impostos.

Ontem Durão Barroso exprimia a sua angústia pela premência do problema. Curiosamente, logo depois das recentes declarações da inefável Maria José Morgado, este Robin Hood de saias, versão moderna, que não se cansa de prosseguir a sua cruzada contra a criminalidade económica organizada, denunciando um Adamastor chamado “crime do colarinho branco” que anda de mão dada com uma corrupção crescente. Como se o aparelho do Estado passasse incólume no teste da corrupção, como se apenas os malfadados empresários que teimam em sorver os recursos do país em seu benefício (em vez de criarem e repartirem riqueza) fossem as únicas fontes deste mal.

As consciências agitadas que repousam sobre os esqueletos do Maio de 68 vivem enquistadas em delírios anacrónicos. Não conseguem superar o que resta da ortodoxia ideológica, por entre os esforços de moderação do que vêm de um passado de radicalização. Esta senhora tem um insólito acolhimento entre os órgãos da comunicação social – porque convém fazer a vénia a quem surge no papel de justiceira popular. Ela continua a engrossar o imaginário daqueles deserdados que não deixam olhar para os “malditos capitalistas” como alguém que existe para fugir aos impostos, para distorcer em seu favor as regras, como gente que não tem escrúpulos sociais e que, assim que pode, enriquece empobrecendo os desfavorecidos.

Já chega desta retórica bafienta. Já chega de apontar todas as culpas dos males que temos ao capitalismo. Já chega de obscurecer as alternativas, como se elas fossem mais justas ou proporcionassem mais bem-estar geral. Já é tempo de abandonar o dualismo sectário que vê nos empresários os maus da fita e nos trabalhadores os que são genuinamente bons, os explorados, aqueles que se não fossem os insondáveis mistérios do capitalismo estariam decerto numa situação melhor. E quem lhes dava emprego e o sustento?

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