15.1.04

Santana Lopes, candidato à presidência da república: um espelho do país que temos

Perfila-se cada vez mais esta possibilidade, para gáudio de largos sectores da nossa comunicação social que esfregam as mãos com a ascensão de figuras mediáticas. Daquelas que auxiliam as vendas, por serem alvos privilegiados de atenção da populaça. Por conseguirem prender a atenção do cidadão médio não pelo seu valor intrínseco, mais pelo embrulho de celofane em que aparecem embrulhados. Pessoas que trazem consigo a luz cintilante do néon. Que fazem suspirar as tias solteironas, e que preenchem o imaginário de donzelas comprometidas que se recusam a assumir as suas fantasias. Pessoas que são mestres na arte da ilusão. Pessoas que já fizeram mil e uma coisas para estarem sempre na ribalta, sob a luz deslumbrante dos holofotes. Pessoas que se julgam imprescindíveis para elevar a moral e o bem-estar dos portugueses. Mesmo que tenham mentindo descaradamente ao longo de toda a sua vida política, sobretudo depois das derrotas que a vida interna do seu partido as tem brindado.

Santana Lopes corresponde ao perfil traçado. Para esta insólita personagem, o milagre das urnas transformou-o num vencedor, quando anteriores combates partidários o tinham colocado pela enésima vez às portas do abandono da vida política. Promessas de abandonar a vida política foram repetidas à exaustão, com dramatismo. Como quem lança um apelo à espera que a audiência, agoniada, clame para que o “Pedro” fique. Promessas todas incumpridas, aliás a preceito do perfil que encaixa no político típico dos dias que correm.

Santana Lopes é isto e muito mais. Sobretudo é o paradigma do que mais execrável existe no terreno minado da política. A aura que dispõe, muito alimentada por uma comunicação social a quem o glamour interessa, serve para apagar a mediocridade intelectual. Os “feitos” na Figueira da Foz e no que leva de mandato à frente da câmara de Lisboa são o capital de confiança que o levam a aspirar ao cargo de presidente da república. Para quem tem o céu como limite na sua ambição política, nada de surpreendente. Como aliás não há surpresa se se antecipar que Santana Lopes pode vencer as eleições e ser presidente de um país também ele medíocre. Estão bem um para o outro – Santana, possível presidente, e o país. Pela característica que os une.

Confesso que o cenário me agrada. Para quem tem uma certa admiração pela teoria do caos, que pode levar o país a erguer-se dos cacos para algo de alternativo que não poderá ser pior, imaginar Santana Lopes no cadeirão da presidência dá um certo gozo. Daqui a um novo passo que se precipita em direcção do caos, espelho da baixeza que campeia entre a população, do mundo cor-de-rosa e faz-de-conta em que vivemos absortos.

Se este é o país que temos, há alguma estranheza que Santana Lopes possa ser o seu presidente?

Sem comentários: