Tinha acabado as aulas. Saía da universidade em direcção a casa. Ao dobrar a esquina que dá acesso à rua, vi à porta uma rapariga, por sinal interessante, que carregava um cesto de generosas dimensões. À medida que entravam e saíam alunos, ela entregava uma pequena embalagem azul com uns dizeres debruados a cor-de-rosa. Quando me acercava da saída cruzei-me com um dos felizardos que tinha sido contemplado com a oferta. Vi então que se tratava de preservativos.
Fui-me abeirando da simpática menina. Pensei com os meus botões: também vou ser agraciado com uma caixinha de preservativos. Não que seja daqueles desalmados que aceitam com sofreguidão as ofertas de campanhas publicitarias. Confesso que não tenho essa avidez de meter ao saco o que quer que seja só porque é oferecido. Quando, em supermercados, sou confrontado com estas campanhas, muitas delas servindo-se de meninas deveras simpáticas, passo ao lado e recuso o que me é gentilmente oferecido. Mas ontem, não sei bem porquê, estava disposto a aceitar o que estava à espera de me ser oferecido.
Ensaiei um sorriso, antecipando o agradecimento pela caixinha azul e cor-de-rosa que tinha a certeza que dentro de segundos ia parar às minhas mãos. Desenganei-me. A menina olhou para mim e, com desdém, ficou hirta. A sua mão permaneceu dentro do cesto, imóvel, não retirando a caixinha que eu esperava como oferta. Aquele gesto altivo derrubou a simpatia que em breves segundos a menina tinha demonstrado.
Pior do que isso, a recusa deixou-me devastado. À saída da universidade fui andando, acabrunhado, tentando arranjar explicações para a minha desdita. Interroguei-me porque teria sido recusada a oferta, sobretudo quando pude observar que todas as pessoas (de ambos os sexos) que tinham entrado e saído da universidade antes de mim tinham sido bafejadas pela sorte e pela simpatia da menina. E porque não também eu?
As hipóteses começaram a desfilar mentalmente. Quis começar por ser simpático comigo mesmo, para tentar arrebatar a auto-estima que por momentos tinha ficado ferida. Como ia de fato e gravata, suspeitei que a menina tivesse recusado a caixa de preservativos por esta campanha publicitária estar direccionada para a população estudantil. Paguei os custos de envergar o formalismo que anda comigo durante a semana. Mas pensei em injustiça: outros colegas meus, até mais velhos, preferem a informalidade que os não distingue dos alunos a não ser pela diferente faixa etária. Seriam eles contemplados pela oferta, ou a sua idade também os colocava à margem, como me aconteceu?
Discerni uma segunda hipótese, menos simpática. A menina, ao olhar-me de cima a baixo por uns céleres segundos, terá recusado oferecer-me a caixinha ao reparar que o meu anelar esquerdo transposta uma aliança. Descartei esta hipótese, porque nos tempos que correm o estado civil não é o critério determinante para ajuizar da utilização do que ela estava a oferecer. As nuvens negras adensavam-se na minha cabeça, sobretudo quando outra hipótese foi aventada. Teria a recusa sido motivada pelo meu pretenso ar assexuado? Fiquei alarmado com esta hipótese. A auto-estima estava a tocar no fundo. Não demorei muito a rejeitar esta hipótese, porque as evidências são a prova da sua improbabilidade.
Restava uma hipótese: aqueles preservativos eram oferecidos apenas aos mais jovens. Não fiquei menos sossegado ao reconhecer que esta é a melhor explicação para ter saído da universidade com a mão estendida, com uma mão cheia de nada e outra da mesma coisa.
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