Não é a discriminação positiva que tanto favorece os funcionários públicos, habituados a regalias que são uma miragem para os trabalhadores do sector privado. Não são os “direitos adquiridos” que desoneram os funcionários públicos da responsabilidade que os demais trabalhadores têm. Não vou sequer mencionar a ideia que o emprego na administração pública é para toda a vida (a menos que o vínculo seja rompido pelo trabalhador), quando os outros não têm acesso a essa garantia. Nem vou perder tempo aludindo o poder desmesurado dos sindicatos da função pública.
Os trabalhadores da função pública também sofrem de uma intolerável discriminação negativa. A menos que a legislação tenha mudado, não podem gastar dinheiro em casinos. Em rigor, apenas lhes é vedado o acesso à sala onde as apostas mexem com somas avultadas – a roleta e quejandos. Os funcionários públicos são admitidos às slot machines, porventura porque o legislador investigou a fundo e descobriu que aí não se torra tanto dinheiro como na sala onde as apostas sobem a altas paradas.
Esta é uma intolerável discriminação que veda uma liberdade fundamental de qualquer cidadão (a menos que o vício do jogo seja doentio e a prodigalidade assustadora que um tribunal impeça o jogador compulsivo de frequentar casinos). Ao que sei, a proibição que atinge funcionários públicos tem esta motivação: como os seus salários têm origem no erário público, é ilegítimo que os dinheiros dos contribuintes acabem por morrer na mesa verde de um casino. Como se fosse necessário o sempre paternalista Estado nos lembrar que há jogos de pecado, no intrigante e paradoxal comportamento de quem tolera o jogo (pelos fartos proventos, via impostos, que os casinos pagam) mas, ao mesmo tempo, censura a sua existência.
Para os moralistas encartados, a medida justifica-se. Se os funcionários públicos são pagos através do dinheiro furtado aos contribuintes, que esses proventos não sejam gastos no vício sórdido do jogo. Até porque – continuando na ladainha moralista – o vício impregnado pode toldar o discernimento dos funcionários públicos. A medida tenciona impedir distracções que prejudicam o desempenho. Seria um duplo desperdício: consumindo inutilmente parte dos impostos que revertem a favor dos salários dos funcionários públicos, e tendo ao serviço gente cercada pelo vício do jogo e pouco interessada em produzir.
Por mais atraentes que sejam os argumentos dos moralistas que aceitam a proibição, acho-a injusta. Primeiro, porque é uma proibição, com a conotação negativa que todas as proibições têm. Continuamos presos às proibições, numa sociedade que se impõe em vez de tolerar. Um exemplo sintomático: no sítio onde moro vai ser discutido o regulamento do condomínio. Só o artigo que enumera os comportamentos proibidos aos condóminos estende-se da alínea a) à alínea x)! Em segundo lugar, custa-me a aceitar como se pode determinar por lei onde os funcionários públicos não podem gastar o seu salário. Cá está a discriminação negativa que os coloca num estatuto desconfortável. Os outros trabalhadores podem gastar o dinheiro onde lhes apetecer. Os funcionários públicos convivem com este estrangulamento da sua vontade.
Que interessa que os funcionários públicos sejam remunerados através dos impostos que pagamos? O salário é a compensação devida pelo seu trabalho. O salário dos funcionários públicos é diferente dos demais porque tem origem nos impostos? Se assim é, ser funcionário público é muito desconfortável. Afinal faz sentido o activismo sindical que tanto protege as regalias dos trabalhadores da administração pública. Por outro lado, lamento que esta vigilância paternalista se fique pela metade. Talvez fosse mais importante vigiar a produtividade dos funcionários públicos. Responsabilizá-los pelo que fazem, pela qualidade do que fazem, penalizá-los pelo que não fazem, ou pelo que não chegam a fazer em tempo útil. Como de costume, o tiro acerta no alvo errado: não é o destino dos proventos que interessa, mas o desempenho dos funcionários públicos.
Uma última perplexidade: esta proibição é eficaz? Descontando o exercício da consciência individual (matéria muito volátil…), como se fiscalizam os funcionários públicos tentados pela ganância do dinheiro fácil que, em teoria, o jogo proporciona? Os funcionários públicos ostentam uma marca invisível detectada quando franqueiam as portas do casino, accionado um alarme que leva à sua detenção? Há leis, mais as suas proibições que fermentam a adorada autoridade pública, que pertencem ao domínio do patético.
Os trabalhadores da função pública também sofrem de uma intolerável discriminação negativa. A menos que a legislação tenha mudado, não podem gastar dinheiro em casinos. Em rigor, apenas lhes é vedado o acesso à sala onde as apostas mexem com somas avultadas – a roleta e quejandos. Os funcionários públicos são admitidos às slot machines, porventura porque o legislador investigou a fundo e descobriu que aí não se torra tanto dinheiro como na sala onde as apostas sobem a altas paradas.
Esta é uma intolerável discriminação que veda uma liberdade fundamental de qualquer cidadão (a menos que o vício do jogo seja doentio e a prodigalidade assustadora que um tribunal impeça o jogador compulsivo de frequentar casinos). Ao que sei, a proibição que atinge funcionários públicos tem esta motivação: como os seus salários têm origem no erário público, é ilegítimo que os dinheiros dos contribuintes acabem por morrer na mesa verde de um casino. Como se fosse necessário o sempre paternalista Estado nos lembrar que há jogos de pecado, no intrigante e paradoxal comportamento de quem tolera o jogo (pelos fartos proventos, via impostos, que os casinos pagam) mas, ao mesmo tempo, censura a sua existência.
Para os moralistas encartados, a medida justifica-se. Se os funcionários públicos são pagos através do dinheiro furtado aos contribuintes, que esses proventos não sejam gastos no vício sórdido do jogo. Até porque – continuando na ladainha moralista – o vício impregnado pode toldar o discernimento dos funcionários públicos. A medida tenciona impedir distracções que prejudicam o desempenho. Seria um duplo desperdício: consumindo inutilmente parte dos impostos que revertem a favor dos salários dos funcionários públicos, e tendo ao serviço gente cercada pelo vício do jogo e pouco interessada em produzir.
Por mais atraentes que sejam os argumentos dos moralistas que aceitam a proibição, acho-a injusta. Primeiro, porque é uma proibição, com a conotação negativa que todas as proibições têm. Continuamos presos às proibições, numa sociedade que se impõe em vez de tolerar. Um exemplo sintomático: no sítio onde moro vai ser discutido o regulamento do condomínio. Só o artigo que enumera os comportamentos proibidos aos condóminos estende-se da alínea a) à alínea x)! Em segundo lugar, custa-me a aceitar como se pode determinar por lei onde os funcionários públicos não podem gastar o seu salário. Cá está a discriminação negativa que os coloca num estatuto desconfortável. Os outros trabalhadores podem gastar o dinheiro onde lhes apetecer. Os funcionários públicos convivem com este estrangulamento da sua vontade.
Que interessa que os funcionários públicos sejam remunerados através dos impostos que pagamos? O salário é a compensação devida pelo seu trabalho. O salário dos funcionários públicos é diferente dos demais porque tem origem nos impostos? Se assim é, ser funcionário público é muito desconfortável. Afinal faz sentido o activismo sindical que tanto protege as regalias dos trabalhadores da administração pública. Por outro lado, lamento que esta vigilância paternalista se fique pela metade. Talvez fosse mais importante vigiar a produtividade dos funcionários públicos. Responsabilizá-los pelo que fazem, pela qualidade do que fazem, penalizá-los pelo que não fazem, ou pelo que não chegam a fazer em tempo útil. Como de costume, o tiro acerta no alvo errado: não é o destino dos proventos que interessa, mas o desempenho dos funcionários públicos.
Uma última perplexidade: esta proibição é eficaz? Descontando o exercício da consciência individual (matéria muito volátil…), como se fiscalizam os funcionários públicos tentados pela ganância do dinheiro fácil que, em teoria, o jogo proporciona? Os funcionários públicos ostentam uma marca invisível detectada quando franqueiam as portas do casino, accionado um alarme que leva à sua detenção? Há leis, mais as suas proibições que fermentam a adorada autoridade pública, que pertencem ao domínio do patético.
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