Como está na ordem do dia o cartaz xenófobo da malta da extrema-direita, com um simpático convite para os estrangeiros embarcarem no próximo voo de regresso aos países de origem, nada melhor que uma versão suavizada do mesmo tipo de terrorismo intelectual. O município de Ponte de Lima colocou quatro outdoors de grandes dimensões nas entradas da povoação, convidando os turistas sem sensibilidade ambiental a não pararem na vila minhota para não a emporcalharem.
Que é como quem diz, turistas porcos não são bem-vindos. Que façam de Ponte de Lima ponto de passagem, não ponto de paragem. Que o lixo causado pelo desleixo e pela inconsciência seja largado noutras localidades, que o problema já não é da povoação limiana. Há anos fabricou-se o estereótipo do turista de pé descalço. Agora que o Maio de 68 não é mais que uma recordação que afaga folclores reminiscentes da rebeldia borbulhante, e que os outrora turistas de pé descalço se renderam aos prazeres consumistas da burguesia, eis que surge uma nova categoria de turista de ralé: o turista badalhoco.
Parece-me que o cartaz reproduz o mesmo registo discriminatório dos rapazes da extrema-direita. Onde uns se despedem, sem comoção nem saudade, dos imigrantes que tresloucam a grandiloquente portugalidade, outros escorraçam os turistas que espalham lixo pelas ruas e jardins locais. Em ambos os cartazes, a mensagem é de exclusão. Divorcia-se dos cânones politicamente correctos que imperam nos dias que correm – os cânones da inclusão. Daniel Campelo pôs-se a jeito da comparação com a extrema-direita. E se o cartaz destes precedeu o da autarquia limiana numa semana, mais incompreensível é a teimosia deste outdoor que adverte, preto no branco, que os turistas sem hábitos de higiene pública melhor é não visitarem Ponte de Lima.
Convém escutar o autarca em discurso directo: “é um convite para as pessoas que não são limpas, e que não respeitam as regras ambientais, se irem embora. É um apelo para que quem não tem hábitos de higiene e limpeza urbana não venha a Ponte de Lima, porque aqui não são bem-vindas”. Pergunta imprescindível: estarão os militantes do ambientalismo ao lado de Daniel Campelo? Será Ponte de Lima um santuário para os ecologistas? Estamos habituados a que os zelosos ambientalistas resvalem para o fundamentalismo espúrio, que não hesitam em exibir superioridade cívica de quem ministra lições aos demais. Até agora as associações ambientalistas mantêm-se caladas, o que me causa espanto. Ou talvez não: para quem desconfiava que as acusações de enviesamento político destas associações eram injustas, porventura este silêncio seja comprometedor.
Quem sabe se Daniel Campelo não recebeu inspiração no Verdocas que, todos os dias, dá lição de educação ambiental no canal Panda. Embevecido pela sapiência do Verdocas, o edil descobriu o ambientalista que vivia adormecido dentro de si. Só se lamenta que o presidente da câmara de Ponte de Lima seja míope ao ponto de julgar que os que emporcalham as ruas da vila são os forasteiros. Decerto os habitantes de Ponte de Lima são um escol entre a população nacional, com níveis de instrução ambiental muito acima da média. Daniel Campelo devia perceber que as romarias que o povo minhoto tanto gosta são um altar-mor do lixo espalhado pelo chão. Que os piqueniques, tão enfaticamente festejados pelo povo sequioso de lúdicos momentos partilhados com as formigas, deixam um rasto de lixo pelas matas e jardins. Os forasteiros não têm o exclusivo da imundície. Que não venha dizer que a campanha não alimenta “nenhuma discriminação racial, religiosa ou política”. É bem pior que isso: é xenofobia regional, um umbiguismo incompreensível, como se os outros (os que não vivem em Ponte de Lima) fossem obrigados a mostrar passaporte para franquear as portas que dão entrada na vila. O feudalismo vive aprisionado nas mentes de alguns.
Para o final sobra uma interrogação: como se enxotam os visitantes indesejados que semearem lixo nas ruas de Ponte de Lima? Estará prevista uma brigada de costumes, de olho vivo nos forasteiros que prevaricarem? Passam multa? Afinarão o bastão? Ou far-se-á um cadastro ambiental, com dados inseridos no famoso cartão único, para facilitar o controlo dos visitantes que são bem-vindos e dos outros, aqueles que farão melhor em ladear Ponte de Lima?
Que é como quem diz, turistas porcos não são bem-vindos. Que façam de Ponte de Lima ponto de passagem, não ponto de paragem. Que o lixo causado pelo desleixo e pela inconsciência seja largado noutras localidades, que o problema já não é da povoação limiana. Há anos fabricou-se o estereótipo do turista de pé descalço. Agora que o Maio de 68 não é mais que uma recordação que afaga folclores reminiscentes da rebeldia borbulhante, e que os outrora turistas de pé descalço se renderam aos prazeres consumistas da burguesia, eis que surge uma nova categoria de turista de ralé: o turista badalhoco.
Parece-me que o cartaz reproduz o mesmo registo discriminatório dos rapazes da extrema-direita. Onde uns se despedem, sem comoção nem saudade, dos imigrantes que tresloucam a grandiloquente portugalidade, outros escorraçam os turistas que espalham lixo pelas ruas e jardins locais. Em ambos os cartazes, a mensagem é de exclusão. Divorcia-se dos cânones politicamente correctos que imperam nos dias que correm – os cânones da inclusão. Daniel Campelo pôs-se a jeito da comparação com a extrema-direita. E se o cartaz destes precedeu o da autarquia limiana numa semana, mais incompreensível é a teimosia deste outdoor que adverte, preto no branco, que os turistas sem hábitos de higiene pública melhor é não visitarem Ponte de Lima.
Convém escutar o autarca em discurso directo: “é um convite para as pessoas que não são limpas, e que não respeitam as regras ambientais, se irem embora. É um apelo para que quem não tem hábitos de higiene e limpeza urbana não venha a Ponte de Lima, porque aqui não são bem-vindas”. Pergunta imprescindível: estarão os militantes do ambientalismo ao lado de Daniel Campelo? Será Ponte de Lima um santuário para os ecologistas? Estamos habituados a que os zelosos ambientalistas resvalem para o fundamentalismo espúrio, que não hesitam em exibir superioridade cívica de quem ministra lições aos demais. Até agora as associações ambientalistas mantêm-se caladas, o que me causa espanto. Ou talvez não: para quem desconfiava que as acusações de enviesamento político destas associações eram injustas, porventura este silêncio seja comprometedor.
Quem sabe se Daniel Campelo não recebeu inspiração no Verdocas que, todos os dias, dá lição de educação ambiental no canal Panda. Embevecido pela sapiência do Verdocas, o edil descobriu o ambientalista que vivia adormecido dentro de si. Só se lamenta que o presidente da câmara de Ponte de Lima seja míope ao ponto de julgar que os que emporcalham as ruas da vila são os forasteiros. Decerto os habitantes de Ponte de Lima são um escol entre a população nacional, com níveis de instrução ambiental muito acima da média. Daniel Campelo devia perceber que as romarias que o povo minhoto tanto gosta são um altar-mor do lixo espalhado pelo chão. Que os piqueniques, tão enfaticamente festejados pelo povo sequioso de lúdicos momentos partilhados com as formigas, deixam um rasto de lixo pelas matas e jardins. Os forasteiros não têm o exclusivo da imundície. Que não venha dizer que a campanha não alimenta “nenhuma discriminação racial, religiosa ou política”. É bem pior que isso: é xenofobia regional, um umbiguismo incompreensível, como se os outros (os que não vivem em Ponte de Lima) fossem obrigados a mostrar passaporte para franquear as portas que dão entrada na vila. O feudalismo vive aprisionado nas mentes de alguns.
Para o final sobra uma interrogação: como se enxotam os visitantes indesejados que semearem lixo nas ruas de Ponte de Lima? Estará prevista uma brigada de costumes, de olho vivo nos forasteiros que prevaricarem? Passam multa? Afinarão o bastão? Ou far-se-á um cadastro ambiental, com dados inseridos no famoso cartão único, para facilitar o controlo dos visitantes que são bem-vindos e dos outros, aqueles que farão melhor em ladear Ponte de Lima?
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