Mais uma polémica envolvendo a extrema-direita: o partido nacional renovador (PNR) afixou um outdoor de generosas dimensões com dizeres xenófobos, convidando os imigrantes a regressarem aos países de origem.
Algumas observações antes de me alongar no que verdadeiramente interessa. Primeira observação: intriga-me como há democratas da nossa praça que espumam raiva de cada vez que a extrema-direita sai da toca. Não desce o democrata ao mesmo nível da extrema-direita quando lhe quer negar liberdade de expressão? Fazendo o mesmo jogo, como se distingue dela? Em segundo lugar, não percebem os guardiães da democracia que tanto burburinho acaba por dar uma visibilidade à extrema-direita que de outro modo não teria? As lições de outros países europeus parecem esquecidas: a extrema-direita ganhou clientela eleitoral como reacção espontânea contra os vícios da democracia, um dos quais é o ostracismo a que é votada.
Terceira observação: é deplorável a mensagem afixada no outdoor? É. Ainda há dias li uma notícia informando que os imigrantes representam 7% do PIB nacional. Há estudos científicos que provam que o crescimento económico futuro dos países europeus depende da renovação populacional conseguida à custa da entrada anual de alguns milhares de imigrantes. Sem esquecer a tradição portuguesa de multiculturalidade, impregnada na história que os nacionalistas tanto prezam e aclamam. Contudo, quem lhes pode negar o direito de exprimirem a opinião afixada no cartaz? Ninguém. Em quarto lugar, os Gato Fedorento têm direito a parodiar o cartaz, como o fizeram, emparelhando um outdoor que é todo o contrário do cartaz do PNR (descontando o facto de ter sido colocado sem autorização da Câmara de Lisboa).
É aqui que quero chegar – às consequências do humor dos Gato Fedorento. Em fóruns ligados à extrema-direita, não demoraram ameaças à integridade física dos humoristas. Eis a extrema-direita no seu esplendor: a força bruta é a razão que consegue vindicar. Quando alguém mostra opiniões diferentes das suas, e tem a ousadia de o fazer com a irresistível arma do humor, a forma de arrumar o assunto é pela força do murro. Acredito que este pessoal da extrema-direita não esteja preocupado com a imagem. Nisso são a antítese dos profissionais que dominam a paisagem política. São fiéis aos seus princípios, por mais execráveis que apareçam aos olhos da maioria da sociedade. A extrema-direita não se importa de vomitar dislates que voltam a maioria das pessoas contra ela. Nisto são coerentes e transparentes.
Acho detestável qualquer manifestação de violência. Quando me chegam ao conhecimento estas exibições de força animalesca da extrema-direita apetece cultivar, por um momento que seja, a resposta do tabefe. Repito: não é pela força do braço que as divergências se resolvem. Mas já que esta gente se afadiga em resolver altercações pela irracionalidade da violência, porque não chamá-los a terreiro e, um a um, mostrar que não são campeões do wrestling político. Com condições à partida: os valentões não poderiam actuar em matilha, como é costume. É que são tão valentes, tão valentes, que a força que se dizem dispostos a usar destila a desproporção habitual: esbofeteiam indefesas pessoas, atacando-as em grupo, onde a razão da força melhor faz ouvir o seu cântico desaustinado. Quando dezenas agridem um indefeso, é fácil ser corajoso. Teriam que vir sozinhos. E só poderiam usar a força do braço, deixando em casa o arsenal de armas que orgulhosamente ostentam.
Concedo, há aqui um vício de raciocínio: quem se entregasse ao jogo de violência cultivado pela extrema-direita estaria a desviar-se da racionalidade da discussão, onde os argumentos são trocados sem apelo a meios violentos. Seria entrar na arena empestada que os truculentos apaniguados da extrema-direita gostam de pisar. A recusa da violência gratuita e estúpida acabaria sempre por vingar. Todavia, às vezes apetece falar a mesma linguagem dos violentos, pelo gosto de os colocar no sítio.
Intriga-me como certos sectores da direita lusitana condescendem com esta extrema-direita saudosista dos tempos salazaristas que ainda são a razão próxima da pequenez que nos sufoca. Denunciam o totalitarismo dos comunistas e da esquerda caviar. Têm razão. Mas perdem-na logo a seguir quando exsudam mal amanhados argumentos que tentam reabilitar a ditadura do Estado Novo. No fundo, não se distinguem da extrema-esquerda totalitária nem da extrema-direita que merece a sua condescendência. Eu não admito os atropelos às liberdades de nenhuma ditadura. Nem a linguagem de violência que funciona como arma para cimentar a razão – uma razão da força, que se distancia da força da razão que vem do confronto apaixonado das ideais.
Algumas observações antes de me alongar no que verdadeiramente interessa. Primeira observação: intriga-me como há democratas da nossa praça que espumam raiva de cada vez que a extrema-direita sai da toca. Não desce o democrata ao mesmo nível da extrema-direita quando lhe quer negar liberdade de expressão? Fazendo o mesmo jogo, como se distingue dela? Em segundo lugar, não percebem os guardiães da democracia que tanto burburinho acaba por dar uma visibilidade à extrema-direita que de outro modo não teria? As lições de outros países europeus parecem esquecidas: a extrema-direita ganhou clientela eleitoral como reacção espontânea contra os vícios da democracia, um dos quais é o ostracismo a que é votada.
Terceira observação: é deplorável a mensagem afixada no outdoor? É. Ainda há dias li uma notícia informando que os imigrantes representam 7% do PIB nacional. Há estudos científicos que provam que o crescimento económico futuro dos países europeus depende da renovação populacional conseguida à custa da entrada anual de alguns milhares de imigrantes. Sem esquecer a tradição portuguesa de multiculturalidade, impregnada na história que os nacionalistas tanto prezam e aclamam. Contudo, quem lhes pode negar o direito de exprimirem a opinião afixada no cartaz? Ninguém. Em quarto lugar, os Gato Fedorento têm direito a parodiar o cartaz, como o fizeram, emparelhando um outdoor que é todo o contrário do cartaz do PNR (descontando o facto de ter sido colocado sem autorização da Câmara de Lisboa).
É aqui que quero chegar – às consequências do humor dos Gato Fedorento. Em fóruns ligados à extrema-direita, não demoraram ameaças à integridade física dos humoristas. Eis a extrema-direita no seu esplendor: a força bruta é a razão que consegue vindicar. Quando alguém mostra opiniões diferentes das suas, e tem a ousadia de o fazer com a irresistível arma do humor, a forma de arrumar o assunto é pela força do murro. Acredito que este pessoal da extrema-direita não esteja preocupado com a imagem. Nisso são a antítese dos profissionais que dominam a paisagem política. São fiéis aos seus princípios, por mais execráveis que apareçam aos olhos da maioria da sociedade. A extrema-direita não se importa de vomitar dislates que voltam a maioria das pessoas contra ela. Nisto são coerentes e transparentes.
Acho detestável qualquer manifestação de violência. Quando me chegam ao conhecimento estas exibições de força animalesca da extrema-direita apetece cultivar, por um momento que seja, a resposta do tabefe. Repito: não é pela força do braço que as divergências se resolvem. Mas já que esta gente se afadiga em resolver altercações pela irracionalidade da violência, porque não chamá-los a terreiro e, um a um, mostrar que não são campeões do wrestling político. Com condições à partida: os valentões não poderiam actuar em matilha, como é costume. É que são tão valentes, tão valentes, que a força que se dizem dispostos a usar destila a desproporção habitual: esbofeteiam indefesas pessoas, atacando-as em grupo, onde a razão da força melhor faz ouvir o seu cântico desaustinado. Quando dezenas agridem um indefeso, é fácil ser corajoso. Teriam que vir sozinhos. E só poderiam usar a força do braço, deixando em casa o arsenal de armas que orgulhosamente ostentam.
Concedo, há aqui um vício de raciocínio: quem se entregasse ao jogo de violência cultivado pela extrema-direita estaria a desviar-se da racionalidade da discussão, onde os argumentos são trocados sem apelo a meios violentos. Seria entrar na arena empestada que os truculentos apaniguados da extrema-direita gostam de pisar. A recusa da violência gratuita e estúpida acabaria sempre por vingar. Todavia, às vezes apetece falar a mesma linguagem dos violentos, pelo gosto de os colocar no sítio.
Intriga-me como certos sectores da direita lusitana condescendem com esta extrema-direita saudosista dos tempos salazaristas que ainda são a razão próxima da pequenez que nos sufoca. Denunciam o totalitarismo dos comunistas e da esquerda caviar. Têm razão. Mas perdem-na logo a seguir quando exsudam mal amanhados argumentos que tentam reabilitar a ditadura do Estado Novo. No fundo, não se distinguem da extrema-esquerda totalitária nem da extrema-direita que merece a sua condescendência. Eu não admito os atropelos às liberdades de nenhuma ditadura. Nem a linguagem de violência que funciona como arma para cimentar a razão – uma razão da força, que se distancia da força da razão que vem do confronto apaixonado das ideais.
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