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Tendo
a firme convicção que há um Medina Carreira dentro de todos nós (descontando
aquele catastrofismo endémico que arrelia), chegou a minha vez de ensaiar uma
proposta para nos vermos livres desta crise tão arreliadora como o negativismo
e a assertividade de Medina Carreira.
Não
me comovo com o progressismo social que vai às catacumbas do passado repescar um
pregão cheio de lirismo: “os ricos que paguem a crise”. Os economistas da
esquerda radical, que ainda por cima exibem uma superioridade moral que é, no
seu caso, uma contradição epistemológica (manda o relativismo que não existam
imperativos categóricos nem moralidades superiores às rivais), são conhecedores
do segredo para fazermos o funeral da crise: põem-se os ricos a pagar muitos impostos.
Não
digo que estes economistas radicais sejam ingénuos. Eu é que não me considero
possuído por este atributo. Por isso alinho mais na receita da moda, que é a austeridade.
Primeiro, as autoridades deviam contratar as melhores agências de comunicação,
daquelas com capacidades encantatórias, para persuadirem a populaça que tempos
tão difíceis exigem a predisposição para o sacrifício pessoal. Depois viriam os
melhores psicólogos explicar, em linguagem de gente normal, que sacrifícios
pesados são um mal necessário para virar a página da austeridade e, depois
desta, a da crise. Só depois viria alguém do governo, em necessária pose grave,
anunciar que em 2012 todos (funcionários públicos e não públicos) teríamos de
trabalhar 262 dias.
Faríamos
os cálculos: quem de 366 (vai ser ano bissexto) tira 262, fica com uma sobra de
104. Como há 52 semanas no ano e cada fim-de-semana atravessa dois dias, estava
tudo explicado. Daríamos de graça o trabalho em todos os feriados (sem
exceção). Íamos trabalhar no natal, no dia de ano novo, no carnaval, na páscoa,
nos feriados políticos (25 de abril, 1 de maio, 5 de outubro, 1 de dezembro) e
no resto dos feriados religiosos e municipais. Contratavam-se dois economistas,
daqueles muito reputados (e que estão sempre a comentar nas televisões), para
fazerem as contas aos ganhos – e teríamos três estimativas diferentes.
Mas
ficava ainda uma pergunta por responder: devemos tanto sacrifício individual em
homenagem ao “bem comum” quando os responsáveis andam por aí, todos pimpões e
ufanos, a transpirar orgulho pela pré-catástrofe que nos deixaram?
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