6.9.11

Masmorras


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Sombras envergando foices sinistras demandam o sangue dos pecadores. Os vultos deslizam sem se fazerem notar. Parecem fantasmas, as suas sotainas castanhas estendem-se até aos pés escondendo os corpos, ora mirrados, ora balofos, dos que perseguem a açoutadora função.
Os corredores apertados e escuros destilam uma humidade pestilenta. Os ombros por vezes atamancam-se contra os tijolos encardidos, aqui e ali roçando no pontual musgo sedimentado numa esquina exposta à humidade. Os frades não renunciam à perseguição. Não deixam o seu passo lento e metódico, e mesmo assim as correrias desenfreadas pelos corredores do túnel acanhado parecem inúteis para a glória da fuga.
É um labirinto, aquele túnel franqueado depois de derrotadas as precatadas hesitações. Diante da sua embocadura, desconfiou do convite feito pela portinhola aberta. Arriscou o passo, arqueando o corpo sob a curvatura dos tijolos que encimavam a gruta metida nas profundezas do subsolo. Fora um passo temerário. Tantas tinham sido as noites assaltadas por pesadelos encenados em túneis sorumbáticos, viscosos, desmultiplicando-se em corredores paralelos que desfocavam a lucidez ao desaguar nas mesmas encruzilhadas.
Foi num ápice que o túnel escureceu. Olhou para trás e não discernia um vestígio de luz que fosse bússola do regresso à casa da partida. À frente, uma cascada de luzes baças preenchia o quadrante diante dos olhos. Os pés tinham de se meter ao caminho – e o caminho era para a frente. Foi quando o corpo metido no espartilho dos corredores sentiu a perseguição dos frades empunhando archotes. Emudecidos, como se ali houvesse uma regra de silêncio sepulcral, ou tivessem feito um voto de renúncia à voz. Pareciam cada vez mais, cercando por todos os lados. Cada vez mais próximos. Os pés escorregaram no dorso aveludado do musgo que atapetava o chão. Escorregou por um declive, o corpo tombando sobre si. Dorido e imerso na escuridão, aprendia as dores quando notou o silêncio quebrado pelo zumbido suave das sotainas deslizantes. As luzes dos archotes fizeram-se notar. E o corpo não respondia.
Que estivesse sossegado. A luz crepuscular da alvorada disse, entretanto, que era só um pesadelo.
(Em Vigo, Espanha)

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