In https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmBGkiLD5B0vV-oPmuHai4R39S7jHqoOSWK9gDfyEm-TQKS9RR1IqxZIVgQmv4TvcbMZTAzlxdRMc8eI4mo4qI_YkA60AAdXks0HeK-fV8IyhFlBZOVb2POH2ET6gVFxh6VA61-w/s1600/entrelinhas.jpg
A
carta diante dos olhos, um cardápio de palavras que se desdobra em
possibilidades e oculta as insinuações que se farejam nas entrelinhas. São como
uma névoa densa que embacia o olhar, ou repetidos copos de vinho que adulteram
o raciocínio. As entrelinhas são apenas uma suspeita. Por vezes, as palavras
enquistadas no papel são de uma nitidez à prova de dúvida. Através delas
desaparece a possibilidade das impossibilidades que fazem tirocínio na amálgama
de disformes palavras que se esgueiram na penumbra do olhar. Outras vezes o
pensamento confunde-se com os múltiplos sentidos que se encadeiam num amontoado
de palavras. Como se as palavras escritas, as palavras ditas, fossem a chave
que abre as portas para as palavras insinuadas que vêm atrás.
O
pensamento acha-se embotado pela depuração das impossibilidades. À míngua de
esclarecimento do autor das palavras escondidas no farol das palavras
reveladas, o pensamento debate-se com a impossibilidade das múltiplas
possibilidades das palavras escondidas. Há um tempo imenso gasto na
hermenêutica das suposições. O pensamento deita-se em palavras apenas
imaginadas na sua fermentação. Ele descola do solo, os pés perdem o contacto,
anestesiam-se nas elucubrações.
Nas
entrelinhas, nas apalavradas entrelinhas que são o soro que fertiliza
especulações estéreis, é-se apanhado na adivinhação do pensamento alheio. É a
maior das impossibilidades. O mal já está feito. Começou quando alguém sussurrou
ao conhecimento que havia entrelinhas. Continuou quando a experiência ensinou
que há uns quantos que, covardes, obliteram a covardia na cortina de espelhos
das palavras que se supõem em incertas entrelinhas. Adensa-se ao embarcar no
cinismo e a ausente frontalidade adestra, em entrelinhas impostas, as palavras
que se queriam ditas nos olhos.
As
entrelinhas desmembram o entendimento. São um maço de cortinas espessas que se
deitam umas em cima das outras, em camadas sucessivas que deturpam o entendimento.
Tudo se passa como se à nossa volta se ocultassem diferentes dimensões
paralelas. Dimensões que ficam escondidas da curiosidade dos olhares que veem.
1 comentário:
Soberbo, PVM!
Palavras perdidas, largadas à sua sorte...
Quanto tudo se pensa perdido, resta-lhes sempre a sorte.
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